Partidos estão caçando os eleitores “bolsolula”

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Foto: Alan Santos / Divulgação

Partidos de centro e de direita se preparam para se aproveitar, nas eleições municipais no Nordeste, da queda na reprovação do governo Jair Bolsonaro. Pesquisas internas mostram que o presidente ganhou adesão principalmente entre eleitores lulistas — uma fatia do eleitorado que aprova o governo, mas não é de direita. Para conquistá-los, a melhor estratégia, segundo dirigentes, é evitar a discussão ideológica.

Em publicação nesta sexta-feira, Bolsonaro disse que não irá “participar, no 1° turno, nas eleições para prefeitos em todo o Brasil”, alegando que tem muito trabalho na Presidência e que isso “tomaria todo meu tempo num momento de pandemia e retomada da nossa economia”. Isso não significa, porém, que políticos não tentarão vincular o nome deles ao do presidente.

Na visão de presidentes de partidos ouvidos por ÉPOCA, eleitores que rejeitavam Bolsonaro por temer perder o Bolsa Família agora aprovam o governo por ter pago o auxílio emergencial na pandemia. Por isso, o impacto foi maior no eleitorado mais pobre. Sondagens internas dos partidos mostram que, depois do auxílio, a rejeição a Bolsonaro passou a ser menor do que a aprovação em boa parte das pequenas e médias cidades de Alagoas, Piauí e Pernambuco, por exemplo.

No interior, porém, há uma preocupação: a estratégia é de que os candidatos até podem se mostrar bolsonaristas, mas sem bater no ex-presidente Lula, cuja popularidade ainda é alta. A ideia é mostrar proximidade com Bolsonaro sem “ideologizar” a disputa, já que não se sabe até que ponto isso pode ajudar. Já os setores da oposição que querem fazer das eleições municipais um palanque contra Bolsonaro devem sair enfraquecidos, avaliam dirigentes partidários.

É o que deve ocorrer em Barra da Corda (MA), com 86 mil habitantes, em que o deputado Hildo Rocha (MDB) foi inaugurar uma obra junto ao ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, nesta semana. Segundo uma pesquisa a que o deputado teve acesso, a aprovação a Bolsonaro foi de 15% a 60% na cidade após o auxílio. Ele aposta que, com isso, o candidato do PL, Rigo Teles, consiga tirar a prefeitura das mãos do PC do B nestas eleições.

“O sujeito aqui pode bater no PT com tranquilidade, não pode é bater no Lula. A esquerda vai perder muito espaço aqui no Maranhão. A tendência é perder espaço para partidos de direita ou de centro, mas mais de centro, porque a direita não tem nomes”, prevê o deputado.

Para Carlos Lupi, presidente do PDT, o impacto do auxílio emergencial tem um “prazo de validade”, já que ele não se sustentará em R$ 600 até o final do ano.

“Nas capitais, ele (Bolsonaro) entra no eleitorado do Lula. Não entra no eleitorado de vanguarda, de centro-esquerda. Ele começa a ter uma força no eleitorado mais carente, mas disso para uma eleição municipal há uma distância grande, porque as pessoas vão querer discutir asfalto, se a escola está funcionando”, avalia.

Ele pontua que, em algumas cidades maiores, vai haver uma discussão mais ligada à agenda de costumes conservadora, com candidatos que queiram se associar a Jair Bolsonaro, mas acredita que o impacto disso nas eleições municipais será baixo, de forma geral.

Heitor Freire (PSL), deputado do Ceará e pré-candidato à prefeitura de Fortaleza, disse que encomendou pesquisas em cidades do estado e constatou casos em que Bolsonaro “tinha um ótimo e bom de 4% e aumentou para 10%”, o que ainda é um patamar muito baixo, segundo ele.

“Em algumas cidades aumentou para 30% (de aprovação), mas a gente tem ainda 70% contrários. O auxílio emergencial e a transposição do rio São Francisco ajudaram. O pessoal não vai mais ficar com medo do novo, de quem tem uma fala um pouco mais conservadora ou de direita. Mas eleição municipal é totalmente diferente de eleição federal, não tem disputa ideológica. O PSL talvez aumente de 10 vereadores para 100, o que ainda é muito pouco”.

Marx Beltrão (PSD), deputado de Alagoas, avalia que, sem o envolvimento direto de Bolsonaro, será difícil se aproveitar do capital político devido ao aumento de popularidade.

“Acho que tentar colar a imagem só funciona se tiver reciprocidade. Às vezes o cara tenta pegar carona e não funciona. Para colar imagem no presidente tem que ser alguém do perfil dele, e ao menos em Alagoas, eu não vejo nenhum candidato que siga o perfil do presidente”.

Para Carlos Siqueira, presidente do PSB, o impacto será maior nas capitais, onde a corrida é menos “paroquial”, a depender do grau de envolvimento real que Bolsonaro terá.

“Os programas assistencialistas geram, sim, vantagem eleitorais para os governantes de plantão. Trata-se de uma população de extrema pobreza, são programas necessários. Mas isso não se aplica às eleições municipais, isso se aplica a 2022. E o Renda Brasil deve favorecer ainda mais o governo em eleitorados que, na eleição passada, foram bastante hostis”.

Uma das corridas que podem ser afetadas é a de João Pessoa (PB). Diversos candidatos devem disputar para mostrar proximidade com as ideias e com os integrantes do governo federal. Entre eles estão o radialista Nilvan Ferreira (MDB), o deputado estadual Wallber Virgulino (Patriota), e, mais ao centro, o ex-deputado estadual Raoni Mendes (DEM) e o deputado federal Ruy Carneiro (PSDB). O bolsonarismo deve ter um papel importante, avaliam políticos da Paraíba, porque a candidata da situação é Edilma Freire, parente do atual prefeito, Luciano Cartaxo (PV), e o nome dela não tem grande expressão no município.

“Mesmo diante da afirmativa de Bolsonaro de que não irá participar das eleições, tem candidatos buscando colar a imagem”, diz Ruy Carneiro. “Essa questão de (o presidente) estar bem ou estar mal é uma questão sazonal, então eu acho que a tendência é o debate ser mais municipal. Não acredito numa eleição em que o nacional vai predominar nas cidades”.

No Piauí, estado do presidente do PP, Ciro Nogueira, a situação é peculiar. A aproximação recente entre Ciro e Bolsonaro fortalece os candidatos do partido, mas em diversas cidades, o PP deve se coligar ao PT, partido do governador, sacramentando o “bolsolulismo”. Em outras, em que o PP e o PT estão em chapas opostas, a expectativa é de uma corrida mais polarizada, onde temas da política nacional podem ter mais proeminência.

“O Nordeste é mais conservador que o resto do Brasil”, avalia Ciro Nogueira, presidente do PP. “Nunca foi petista, mas foi lulista. E ele (Bolsonaro) se assemelha muito ao Lula pelas sua espontaneidade para se comunicar. As pessoas o veem como um de nós que chegou ao poder. Ele já tem sido recebido com mais paixão do que o Lula”.

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