Indígenas expatriados denunciam à ONU ameaças no Brasil

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Lideranças indígenas temem represálias depois de denunciar, na ONU, invasores em suas terras. Eles, porém, agora pedem que as autoridades brasileiras tomem medidas de proteção para garantir que emboscadas e ameaças não ocorram em seu retorno ao Brasil. Nesta semana, lideranças do povo Arara estão nas Nações Unidas para relatar aos órgãos internacionais a situação de vulnerabilidade de sua comunidade.

Em encontros fechados ou em discursos diante dos governos, eles insistiram sobre o fato de que, se os anos de Jair Bolsonaro foram superados, a situação continua sendo ameaçadora. O temor do grupo é de que, no retorno ao Brasil, a situação seja transformada em uma ameaça à vida dos dois líderes. Ao UOL, os represetantes do povo Arara confirmaram que vem sofrendo intimidações e alertas.

“Estamos denunciando o desmatamento na Amazônia e queremos que a ONU pressione o governo para cumprir suas obrigações”, afirmou Mobu Odó Arara, cacique do povo Arara da Terra Indígena Cachoeira Seca. Segundo ele, sua comunidade conta com 120 famílias. Mas outras 2 mil pessoas também vivem dentro de suas terras. “Transitamos pela mesma estrada que essas famílias usam.

É nossa única forma de chegar em nossa comunidade. Recebemos ameaças antes mesmo de fazer essas denúncias na ONU. Eu estou aqui e não sei o que vai acontecer depois”, disse o cacique. Mobu Odó conta que já teve de ser escoltado duas vezes para chegar até sua aldeia e que seu sogro foi assassinado por pescadores. Hoje, ele diz que as ameaças vêm de fazendeiros e grileiros.

“Com o governo Lula, as coisas melhoraram. Mas ainda não temos segurança+, disse. Numa carta enviada ao Itamaraty e outros órgãos do governo no dia 22 de setembro, a Associação Direitos Humanos em Rede (“Conectas Direitos Humanos”), Instituto Maíra e Associação Kowit do povo Arara pediram que “providências acerca da proteção integral das lideranças indígenas do povo Arara da Terra Indígena Cachoeira Seca no regresso de sua missão à Genebra, em razão da participação de duas de suas lideranças na 54ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU”.

“A Terra Indígena Cachoeira Seca e seu povo guardião, aqui representados pelas lideranças do povo Arara, têm sido submetidos a inúmeras violações e violências enquanto povos de recente contato, estão dentro de um território enquadrado, desde 2019, enquanto um dos mais desmatados do Brasil”, diz a carta, obtida com exclusividade pelo UOL. “Junto disso, os impactos sofridos a partir da instalação do empreendimento de Belo Monte tem gerado contínuas consequências gravíssimas para o aumento das invasões que, por sua vez, geram violências diversas para as lideranças no território. Isso ocorre mesmo diante da exigência de desintrusão do território presente nas condicionantes ambientais de instalação do empreendimento”, afirmou.

Segundo as entidades, neste cenário de violações crescentes e do aumento massivo de invasores no território, representantes do povo Arara estiveram em junho de 2023 em Brasília para uma série de agendas com autoridades do Governo Federal. Continua após a publicidade “Na ocasião, buscaram informações e providências acerca do processo necessário, ainda que tardio, de desintrusão do território. Inclusive, até o momento, restam pendentes importantes encaminhamentos, a respeito de providências listadas em reunião sobre o Plano de Desintrusão da TI Cachoeira Seca”, disse.

De fato, durante a reunião em junho, Maria Janete Carvalho, diretora da Diretoria de Proteção Territorial da FUNAI, explicou que o processo de regularização fundiária da TI Cachoeira Seca começou na década de 1970. A TI, segundo ela, foi reduzida por conta da Rodovia Transamazônica e assentamentos do INCRA. Ela ainda indicou, em junho, que em 90 ocorreria a desintrusão e admitiu que a demora na retirada dos invasores aumenta a violência contra os indígenas. Por outro lado, o governo está tomando cuidado com a publicação da lista dos ocupantes de boa e má fé para não agravar ainda mais a violência. Mas, três meses depois, a carta ao governo deixa claro que muitas das promessas feitas durante a reunião ainda não foram implementadas.

O grupo, portanto, fez dois pedidos: A garantia da logística de segurança dos indígenas, com a adoção de todas as providências necessárias à tutela da vida e integridade física ao longo do trajeto de retorno de Altamira até a TI Cachoeira Seca, a partir do dia 1º de outubro; e A designação de representante desse órgão para que se possa realizar o contato direto nos próximos dias, em caso de emergência relativa a segurança, e também para tratativas a respeito da logística necessária à proteção da vida e integridade física das pessoas envolvidas na missão

r A denúncia Na ONU, as lideranças indígenas foram duras em relação à situação atual. Num discurso no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, Tymbektodem Arara, presidente da Associação Kowit, alertará sobre a situação dos povos indígenas no país. A fala foi apoiada pelas entidades Conectas e Instituto Maíra, que “demonstram muita preocupação com a violação dos direitos indígenas no Brasil”.

“Continuamos lutando contra a tese do marco temporal”, dirá a liderança indígena. “Somos um povo de contato inicial, viemos aqui para exigir respeito às nossas vidas e ao nosso território. Sofremos muitas invasões. A demarcação só foi feita 30 anos após o contato com os não indígenas, em 2016”, explicou. “Hoje, em 2023, estamos lutando pela retirada de mais de 2.000 invasores, em decorrência da instalação da usina hidrelétrica de Belo Monte. Nosso território é um dos mais desmatados do país”, alertou. “Pedimos à comunidade internacional que pressione o Brasil para que cumpra seu dever constitucional e garanta que a renovação da licença de operação de Belo Monte inclua a desintrusão da Terra Indígena Cachoeira Seca”, afirmou.

UOL