Aumento menor das tarifas em SP gerou protestos maiores
Se existe alguém que seja inquestionavelmente favorável a que as pessoas parem de ficar reclamando na internet ou na frente da televisão e que tirem os seus traseiros da cadeira e vão à rua protestar, esse alguém é este que escreve.
Até 2005, limitava-me a escrever cartas de leitor a jornais com meus pontos de vista sobre o que me incomodava. Dali em diante, porém, decidi passar da choradeira à ação.
Devo ser um dos poucos cidadãos comuns que têm várias reportagens comprovando serem favoráveis a manifestações populares. Matéria do portal Terra de 2007 registra o que fiz, pela primeira vez, para ir da retórica à prática.
O que fiz, a partir de 2005, foi criar um blog político que passaria a usar como ferramenta para estimular as pessoas a se engajarem em causas.
Usando este Blog, sensibilizei pessoas que pensavam da mesma forma e com elas fundei a ONG Movimento dos Sem Mídia, através da qual convoquei uma meia dúzia de atos públicos e até impetrei ações na Justiça.
Na mais bem-sucedida dessas manifestações, em 2009, centenas de pessoas se reuniram diante do jornal Folha de São Paulo para protestar contra editorial que qualificou a ditadura militar brasileira como “ditabranda”.
Abaixo, imagem daquele ato
Cada uma daquelas manifestações, porém, teve uma marca: a legalidade e o respeito ao direito de quem não queria participar.
A cada um daqueles atos, o Movimento dos Sem Mídia enviou comunicados sobre eles à Polícia Militar antes que ocorressem.
Nunca depredamos nada, nunca impedimos o livre trânsito das pessoas e, assim, jamais tivemos qualquer problema.
Entendo perfeitamente que, muitas vezes, a Polícia é truculenta. Porém, isso costuma ocorrer quando os manifestantes são pobres coitados. No caso dos últimos protestos, conheço o grupo que os promoveu e garanto que é composto por pessoas de classe média.
O grupo que foi às ruas de São Paulo se manifestar durante a semana que finda é o mesmo que, em 2011, promoveu o Churrascão da Gente Diferenciada, do qual participei.
Aquela manifestação ocorreu diante do shopping Pátio Higienópolis, em bairro aristocrático de São Paulo no qual os moradores queriam impedir a construção de uma estação do metrô porque, construída, atrairia pobres.
Esse movimento se intitula “Passe Livre” e tem um braço político composto por partidos como PSOL, PSTU e PCO, apesar de atrair independentes.
Ao contrário do que alguns pensam, não é a primeira vez que se faz um protesto contra aumentos de tarifas do transporte público em São Paulo.
Em 2006, o prefeito de São Paulo era Gilberto Kassab. As tarifas de ônibus e metrô foram reajustadas em 15%, muito acima da inflação, passando de R$ 2 para R$ 2,30.
Em 2010, ainda com Kassab como prefeito, a tarifa do transporte público de São Paulo subiu ainda mais, 17,3%, passando de R$ 2,30 para 2,70. De novo, muito acima da inflação.
Em 2011, o prefeito ainda era Kassab e a tarifa voltou a subir muito, agora em um intervalo bem menor do que nas vezes anteriores. O aumento foi de 11,11%, com o preço passando de R$ 2,70 para R$ 3.
Ninguém, no entanto, tem memória de uma guerra campal pelas ruas de São Paulo igual à que se viu nos últimos dias.
Além disso, desta vez a tarifa subiu muito menos, 6,6%, indo de R$ 3 para R$ 3,20.
No fim de maio, o prefeito Fernando Haddad declarou que, diferentemente do que ocorrera no passado, buscaria dar um aumento menor para uma tarifa que subira, pela última vez, em 2011.
Para dar um aumento abaixo da inflação, Haddad informou que seria preciso aumentar a verba destinada pela Prefeitura às empresas concessionárias de ônibus, o chamado “subsídio”.
Parece justo. Não se pode pensar em melhor uso para o dinheiro dos impostos de todos os paulistanos do que subsidiar o preço da passagem de ônibus e de metrô.
Aqui vale uma informação: a mídia não está aproveitando os tumultos para criticar Haddad porque a passagem de metrô também subiu e, como se sabe, quem aumenta o preço dela é o governo do Estado, ou seja, Geraldo Alckmin.
O que, então, mudou no reajuste das passagens em 2013 frente a 2006, 2010 e 2011?
Primeiro, o aumento foi bem menor. Depois, o prefeito da cidade, agora, é do PT.
Não se pode tirar a razão de qualquer um que proteste contra o preço das passagens no transporte público de uma cidade em que esse transporte é tão ruim. Quanto a isso, não há o que dizer.
O que não se entende, porém, é por que o esforço de Haddad para reajustar a tarifa tão abaixo da inflação de dois anos tenha provocado protestos tão maiores do que anteriormente.
Apesar do apoio de boa parte da população, não se pode negar que houve vandalismo, destruição de patrimônio público e obstrução do direito de ir vir.
A prosseguirem protestos desse tipo, não irá demorar e um cadáver aparecerá.
Os manifestantes, porém, já deram a senha do que pretendem através do principal bordão que vêm entoando: “Se a tarifa não baixar, São Paulo vai parar”.
Sob essa premissa, discordo das manifestações. Ninguém tem o direito de interferir dessa forma na vida da cidade. E muito menos de fazer tal ameaça.
O número estimado de pessoas que participou dessas manifestações é parecido com o que participou do “Churrascão da Gente Diferenciada” – em torno de cinco mil pessoas. Todavia, naquela oportunidade foi uma manifestação bem-humorada e pacífica.
O caráter político-partidário desses protestos está se fazendo sentir. Nunca houve, quando a tarifa subiu outras vezes, um ultimato como esse que ameaça “parar” as vidas dos paulistanos ou depredações e violência como se está vendo
O aumento menor da tarifa, repito, parece ter surtido o efeito contrário do esperado.
Apesar de ainda ter apoio popular, esse movimento vai se deslegitimando. Pessoas que não participavam do protesto se feriram, cada vez mais pessoas estão ficando assustadas.
Por experiência própria, posso afirmar que é mais do que possível fazer manifestações de rua sem causar o que essas que vêm ocorrendo estão causando. Afirmo que os tumultos só ocorreram porque os organizadores dos protestos assim quiseram.
Vi opiniões legitimando os atos públicos serem conduzidos dessa forma porque em países ricos como a França frequentemente há choques com a Polícia e depredações e, assim, protestos promoverem o caos seria coisa de país desenvolvido.
Discordo. Temos que copiar o que há de bom nesses países, não o que há de ruim. Democracia tem como premissa básica substituir a violência entre contrários pelo diálogo político.
O PSOL, o PSTU e o PCO têm todo direito de protestar contra quem quiserem, mas têm que fazer isso às claras e sem violência.
Partidos podem protestar contra Alckmin, Haddad, Dilma ou o Papa. É legítimo. Agora, gerar o caos que estão gerando e, ainda por cima, de forma anônima, sem assumir a autoria, é crime. E crime tem que ser combatido.