O problema de Joaquim Barbosa
Em benefício dos fatos e da transparência desta análise, quero deixar registrado que estou entre os mais veementes críticos que o presidente do Supremo Tribunal Federal, doutor Joaquim Barbosa, conquistou ao longo de sua trajetória no ano passado – isso sem falar nos inimigos, entre os quais não me incluo por absoluta falta de motivos.
Sou um dos muitos inconformados com as condutas midiáticas e autoritárias de Barbosa, com esse seu desejo incontido de aparecer a qualquer custo, com aquela sua proverbial dificuldade em conviver com o contraditório, com a sua dolorosa falta de uma humildade lúcida que se espera de alguém que ocupe posição tão importante.
Apesar disso tudo, tenho minhas dúvidas de que o presidente do STF tenha feito alguma transação ilegal para adquirir o tão falado imóvel em Miami.
Claro que não dá para descartar nada em relação a qualquer um que se lambuze no tipo de poder em que Barbosa se lambuzou até o fastio. Um tipo híbrido de poder, uma mescla entre poder de Estado, poder político e poder financeiro, forjada nas relações às quais tem se entregado por atos e palavras.
Entretanto, não me parece provável que esse cavalheiro tenha cometido algum tipo de ilegalidade. Seria uma estupidez que não condiz com a sua inegável inteligência.
O que é legal, porém, não é necessariamente moral. Alguém que tem se dado a fazer críticas e acusações tão acerbas a tudo e a todos, por força de também ser um servidor público deve estar sempre disposto a explicar, paciente e detalhadamente, negócios milionários como a compra que fez de imóvel tão luxuoso nos Estados Unidos.
Contudo, não deve ser esse o problema do doutor Joaquim Barbosa. Antes, seu problema é o conceito deturpado sobre democracia e sobre direitos civis do qual padece e que não aplica para si mesmo por, claramente, julgar-se acima de suspeitas.
Barbosa é só mais um milionário em um colegiado em que há outros tão milionários quanto ele ou mais. Assim, espera-se que não seja julgado com um rigor quanto ao seu patrimônio que nem sempre é usado para os seus pares que não têm a mesma origem, mas que têm ligações ainda mais fortes com grupos políticos e que fazem negócios ainda menos transparentes.
Obviamente que o leitor saberá intuir a quem me refiro, acima de outros.
O presidente do STF, portanto, não é perigoso por ter feito ou vir a fazer tipos de negócios que são comuns a toda a magistratura, entre outras vertentes do serviço público. Ele é perigoso, sim, mas por sua mentalidade despótica, por sua vaidade embriagante, por seu temperamento imprevisível, por sua falta de capacidade de reflexão.
E, por tudo isso, vejo nele uma legítima ameaça à democracia que jamais deve ser combatida com o moralismo de quinta a que se dá tão frequentemente, mas com serenidade e objetividade quanto aos erros que já cometeu e aos que previsivelmente irá cometer, já que dificilmente virá a se dar conta deles, embriagado que vive consigo mesmo.