MP e PF despontam como vítimas do golpe que ajudaram a dar

Opinião do blog

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Entrevista que o novo ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, concedeu à Folha de São Paulo nesta segunda-feira 16, causaria um escândalo de proporções épicas se o grupo que tomou o poder não estivesse mancomunado com os grandes grupos de mídia.

A entrevista fala mais sobre o que vai ser o “governo” Temer – ao menos enquanto durar – do que qualquer coisa que os golpistas haviam dito até então.

Além das ameaças a movimentos sociais, o sujeito deixou escapar como os golpistas planejam parar a Lava Jato. E tentarão fazê-lo pelo simples e singelo fato de que a investigação fatalmente acabará chegando não só aos vários ministros do regime de facto que estão na sua mira, mas ao titular desse regime.

Para entender a enormidade dita por ninguém mais, ninguém menos do que o MINISTRO DA JUSTIÇA, vejamos trecho de sua entrevista em que ele anuncia que o “governo” Temer planeja desmontar estrutura montada pelos governos do PT que permitiu que o governo Dilma fosse amplamente investigado e, por fim, destituído.

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FOLHA DE SÃO PAULO – Os governos do PT criaram a tradição de indicar para a Procuradoria-Geral da República o integrante da carreira mais votado numa lista tríplice. Vocês vão manter essa regra?

MINISTRO DA JUSTIÇA – O [procurador-geral da República Rodrigo] Janot foi nomeado há seis meses, ainda tem mais de um ano no cargo [até setembro de 2017]. Por isso eu nunca conversei com o presidente Temer sobre o tema. Mas o meu posicionamento é o de que devemos cumprir a Constituição.

FOLHA DE SÃO PAULO – Que não prevê eleição para a formação de uma lista tríplice de candidatos à chefia da Procuradoria.

ALEXANDRE DE MORAES – Não prevê. Prevê que o presidente da República escolha um integrante da carreira para um mandato de dois anos.

FOLHA DE SÃO PAULO – Mas nomear o mais votado pela categoria acabou sendo um hábito que virou regra.

ALEXANDRE DE MORAES – O que garante a autonomia do MP, e isso foi muito discutido na Constituinte, não é só a forma de escolha –até 1988, o presidente poderia indicar alguém de fora da carreira do MP para o cargo, agora tem que ser alguém de dentro dela. Mas o que garante a autonomia é a forma de destituição do procurador-geral. Ele tem hoje um mandato de dois anos. E só pode ser destituído se o presidente da República pedir e o Senado aprovar por maioria absoluta.

Portanto, o presidente da República tem essa liberdade constitucional [de indicar o procurador-geral que não foi eleito pela categoria] dentro desses requisitos. Não é algo arbitrário. É uma questão de freios e contrapesos. O poder de um Ministério Público é muito grande, mas nenhum poder pode ser absoluto.

FOLHA DE SÃO PAULO – A Polícia Federal também quer indicar o seu diretor-geral por lista tríplice e reivindica autonomia financeira e orçamentária.

ALEXANDRE DE MORAES – Cada agente de investigação, cada delegado, tem que ter total autonomia para investigar, não pode sofrer pressões. Agora, a polícia faz parte da estrutura do Executivo. Se cada órgão se transformar num novo poder, vamos ter uma estrutura anárquica.

A polícia tem um poder importante e muito grande. A Constituição determina que quem escolhe [o diretor-geral] é o chefe do Executivo.

Mais claro impossível. Aliás, está tudo correndo dentro do que foi previsto. Claro que escancarar assim planos de enterrar o combate a corrupção viabilizado pelos governos do PT ao ter dado liberdade ao Ministério Público e à Polícia Federal, surpreende um pouco.

As declarações do “ministro da Justiça” sobre os planos dos golpistas para parar a Lava Jato e impedir que o poder volte a ser investigado revela, também, confiança absoluta dos golpistas em que não serão incomodados pela imprensa durante o processo de desmonte da máquina fiscalizadora que permitiu que o PT fosse apeado do poder tão facilmente.

O que os golpistas anunciam já era sabido por Fernando Henrique Cardoso e seu engavetador-geral da República, Geraldo Brindeiro, que ficou durante oito anos no cargo e jamais permitiu que fosse aberta qualquer investigação contra o governo tucano.

A substituição de Rodrigo Janot, se Temer ficar no cargo, fatalmente colocará um empregadinho do “presidente” no lugar do atual procurador-geral da República. Assim como FHC colocou no cargo o primo do então vice-presidente, Marco Maciel, Temer tratará de colocar alguém que possa ser controlado para atacar os adversários do governo e proteger seus apaniguados.

No campo social, o desmonte das políticas públicas avançará a passos largos. E o governo colocou esse brucutu no Ministério da Justiça para promover a repressão contra movimentos que questionem esse desmonte.

Mas a grande ironia em tudo isso está no que Temer pretende fazer para interromper o forte combate à corrupção possibilitado pelos governos Lula e Dilma, com o princípio do “republicanismo”, ou seja, não usar o poder de aparelhar os órgãos de controle para evitar que sejam usados politicamente.

Essa, aliás, é uma questão que considero extremamente mal resolvida.

Fernando Henrique Cardoso conduziu um governo cujos processos por corrupção poderiam ter colocado seu titular na cadeia. A compra de votos para a reeleição ou a privataria poderiam ter colocado o tucano na cadeia e ele provavelmente estaria lá até hoje se não tivesse colocado um filiado ao PSDB no comando da Polícia Federal e o primo do seu vice na Procuradoria Geral da República.

Pergunta: é isso que Lula e Dilma deveriam ter feito?

Muitos dirão que sim, que no Brasil não tem jeito, que ém um país com tradição de golpes de Estado um presidente não pode dar mole para os adversários como fizeram Lula e Dilma.

Sim, de fato foi muita ingenuidade.  Aliás, Lula e Dilma terem dado liberdade ao MP e à PF, além de nomearem juízes isentos para o STF, revela que é mentira que tivessem alguma intenção criminosa – do contrário, nomeariam alguém como Gilmar Mendes para o STF, um engavetador para a PGR e um filiado ao PT para comandar a PF.

Se Lula e Dilma não tivessem sido tão ingênuos a ponto de colocar nos órgãos de controle pessoas que os dois presidentes não controlariam e nem tinham intenção de controlar, certamente não haveria donos de empreiteiras, banqueiros e políticos graúdos presos. Enfim, o país continuaria sendo roubado como sempre foi.

Os inimigos do republicanismo de Lula e Dilma dizem que de nada adiantou serem republicanos e agora o sucessor deles colocar marionetes na PF, no MPF e no STF, quando houver nomeações a fazer. Por isso, seria melhor Lula e Dilma terem colocado aliados nesses órgãos de controle.

Se tivessem feito isso, porém, esses órgãos não teriam prendido tantos corruptos e desmontado esquema de corrupção na Petrobrás que perdurava havia décadas incontáveis.

Ok, mas o republicanismo afastou quem garantia a liberdade das investigações, Dilma Rousseff, e colocou no lugar dela um sujeito que com certeza vai desmontar o aparato investigativo que hoje não se detém diante do nome e das vinculações políticas ou da classe social ou da etnia dos investigados.

Temer apressou-se em declarar que não é nada disso, que o seu ministro da Justiça “falou demais” etc., etc.

Engana-me que eu gosto. É óbvio que Moraes “falou demais”. Explicitou os planos dos golpistas e a razão de terem aplicado tantos golpes para tomar o poder: parar investigações que atingiriam – ou atingirão – o próprio “presidente interino” e os comparsas que nomeou “ministros”.

É óbvio, porém, que era cedo demais para o ministro falastrão entregar o jogo. Isso mostra o nível de pessoa que os golpistas colocaram, simplesmente, no MINISTÉRIO DA JUSTIÇA(!!?).

O mais irônico em tudo isso é que quem deu poder àqueles que tratarão de desmontar o Ministério Público e a Polícia Federal foram essas instituições, através das pessoas que figuram na imagem no alto da página.

Procuradores e promotores do MP, delegados da PF, o próprio procurador-geral da República, inclusive, ajudaram a derrubar a governante honesta que deu condições para que a corrupção fosse combatida e colocaram bandidos no lugar dela, que tratarão de derrubar policiais e membros do MP que queiram continuar combatendo a corrupção independentemente de quem está no poder.

Seria “justiça poética” se esse desmonte da máquina de combate à corrupção construída pelo PT não fosse ruim para todos nós. A corrupção sem pudor vai voltar com tudo e o país regredirá décadas social e institucionalmente.

A menos que medidas drásticas sejam tomadas, vão transformar o Brasil em uma fazendona controlada por um bando de coronéis ladrões, autoritários, ignorantes e depravados. Esse “ministro da justiça” é amostra pronta e acabada do tipo de gente que hoje governa o Brasil.