Esquerda unida contra Bolsonaro

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As pesquisas de intenção de voto ganham uma relevância inédita a uma semana do segundo turno das eleições no Brasil e os resultados de sete serão divulgados a partir desta segunda-feira até quinta, 25, informa o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que permite a divulgação, a qualquer momento, das pesquisas realizadas em data anterior à da eleição, para todos os cargos. Hoje serão publicadas as pesquisas CNT/MDA, BTG /FSB, Vox Populi e RealTime; na terça, Ibope; e, na quinta-feira, Vox Populi e RealTime. As duas últimas terão seus times em campo hoje e amanhã. O levantamento do Ibope é o que terá a apuração mais extensa – de 17 a 23 de outubro.

As sondagens tornaram-se ainda mais importantes nesta reta final porque poderão mostrar, com maior ou menor detalhe, eventuais realocações de votos entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), que disputam o segundo turno. Protagonista da primeira eleição, após o impeachment de Dilma Rousseff e dois anos e meio de governo do impopular presidente Michel Temer, o candidato da extrema-direita Jair Bolsonaro tornou-se alvo de ações judiciais movidas por partidos de oposição que reagem à possibilidade de que ele tenha cometido crime eleitoral para levar vantagem sobre o concorrente de espectro ideológico oposto.

O gatilho para a interpelação judicial foi a informação, publicada na edição de quinta-feira pelo jornal “Folha de S. Paulo”, sobre o suposto uso irregular de WhatsApp por Bolsonaro para atacar Haddad em operações que, se comprovadas, podem configurar financiamento ilegal de campanha por empresários.

Como se não bastasse o risco – ainda que remoto – de impugnação da candidatura de Jair Bolsonaro, seus apoiadores trouxeram a público, no fim de semana, o alerta feito ao Departamento de Estado americano por um congressista sobre o “interesse especial” de grupos da Venezuela, do Irã e do Hezbollah nas eleições brasileiras, sugerindo que o capitão reformado do Exército corre o risco de sofrer um segundo atentado. O primeiro foi o ataque à faca ocorrido em 6 de setembro, durante um comício na cidade mineira de Juiz de Fora e que justificou longo período de hospitalização e sua ausência em debates promovidos por veículos de comunicação.

Arthur Igreja, professor da Fundação Getulio Vargas e especialista em tecnologia e inovação, considera “muito difícil” que seja provado suposto financiamento de campanha através da compra de pacotes de disparo de informações no WhatsApp. “No WhatsApp é muito difícil conectar os pontos e chegar a quem paga a conta, inclusive, por um aspecto técnico. O WhatsApp não reúne mensagens em um servidor. É um sistema que não deixa rastro.”

O especialista diz que, guardando as devidas proporções, o episódio envolvendo Bolsonaro é comparável ao ocorrido nas eleições americanas. “Nas eleições americanas, o instrumento usado foi o Facebook, em que é possível identificar grupos. No WhatsApp essa identificação – se ocorrer – será inédita”, afirma Arthur Igreja, para quem a matéria publicada pela “Folha de S. Paulo” apontou o cerne do problema: “A possibilidade de se comprar lista qualificada de usuários do WhatsApp e a inexistência de legislação específica para determinados procedimentos nas redes sociais.”

Mesmo que passe ileso de qualquer acusação e saia vitorioso do segundo turno, como indicavam as pesquisas divulgadas até sexta-feira, esses últimos acontecimentos podem ter minado de vez a ponte de comunicação entre a direita e a esquerda no país. No momento, são incalculáveis, com baixo risco de erro, as consequências de uma relação que se tornará ainda mais crispada entre os dois campos. Esse cenário coloca em xeque a relação que Bolsonaro com o Congresso. O candidato diz que não vai praticar a política do “toma-lá dá-cá” e demonstra confiança de que não dependerá tanto de apoio parlamentar.

“O que exatamente o candidato quer dizer com ‘toma lá, dá cá? É a barganha política entre Poder Executivo e Poder Legislativo? Como então o candidato pretende aprovar seu programa? Na canetada?”, questiona Paulo Franz, doutorando em Ciência Política, na Universidade Federal do Paraná, e pesquisador do Observatório de Elites Políticas e Sociais.

Franz recorda que a negociação é um dos princípios básicos da democracia. “Engana-se o candidato – e Bolsonaro não foi o único a prometer esse tipo de atitude – que acredita que, uma vez eleito, terá poder imperial para implementar projetos de seu interesse sem a consulta a outros atores. Não é assim. Numa república, os projetos precisam ser aprovados pela maioria dos deputados.”

“Não me espantaria que, embora seja deputado, o candidato tentasse passar por cima desses mecanismos. Vamos lembrar que ele teve muita dificuldade em aprovar os projetos de sua autoria nas quase três décadas de Câmara dos Deputados. Confesso que não vejo muito sentido em avaliar a atuação de um parlamentar em número de projetos aprovados, como se um deputado precisasse criar leis a todo o momento. Mas essa taxa de insucesso de Bolsonaro, dentro da Câmara, expressa um ator político pouco afeito às negociações com outros eleitos. Como presidente, ele terá obrigatoriamente que se adequar”, avalia o pesquisador da UFPR.

Jair Bolsonaro, se eleito presidente, pretende reduzir o número de ministérios. A exemplo, porém, do que ocorreu durante os governos mais recentes, o candidato mostra a intenção de consolidar algumas pastas, o que não significa fazer economia a depender das alternativas que ele terá para reunir pastas, mas sem demitir servidores que têm estabilidade no emprego.

O Ministério da Economia — que poderá somar Fazenda, Planejamento, Indústria e Comércio e Secretaria Geral — deverá ser comandado pelo economista Paulo Guedes, hoje apontado por Bolsonaro como futuro ministro da Fazenda. A ver, se Guedes terá habilidade suficiente para convencer parlamentares a aprovar decisões que ele pretende tomar. Ainda que tendo a concordância do presidente, se Bolsonaro levar o Planalto no dia 28.

Da Valor Econômico