Na política, clã Bolsonaro tem costume de elogiar bandidos infiltrados na PM

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As homenagens a policiais militares que viriam a ser acusados de integrar milícias e os discursos que minimizam a gravidade da atuação desses grupos paramilitares são de longa data na família Bolsonaro.

O ex-capitão da PM Adriano Magalhães da Nóbrega, 42, foragido desde terça (22) sob suspeita de chefiar milícias na zona oeste, foi homenageado pelo senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL) em duas ocasiões.

Em 2003, na Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio), o então deputado estadual propôs uma moção de louvor por desenvolver sua função com “dedicação, brilhantismo e galhardia”. “Imbuído de espírito comunitário, o que sempre pautou sua vida profissional, atua no cumprimento do seu dever de policial militar no atendimento ao cidadão”, escreveu.

Em 2005, o filho do presidente Jair Bolsonaro concedeu ao ex-policial a Medalha Tiradentes. Na justificativa, entre outras razões, o então deputado estadual escreveu que Nóbrega teve êxito ao prender 12 “marginais” no morro da Coroa, no centro, além de apreender diversos armamentos e 90 trouxinhas de maconha.

Flávio Bolsonaro também já apresentou moção de louvor a outro policial militar alvo de mandado de prisão, o major Ronald Paulo Alves Pereira. Apelidado de Maj Ronald ou Tartaruga, ele foi preso preventivamente com outros quatro suspeitos e também é apontado como líder da milícia que atua em Rio das Pedras, na zona oeste do Rio.

Em nota divulgada à imprensa, o senador eleito disse que sempre atuou na defesa de agentes da segurança pública e que já concedeu “centenas de outras homenagens”.

Essa não foi a primeira vez que o nome de Flávio Bolsonaro apareceu ligado a supostos milicianos.

Deflagrada em agosto do ano passado, a Operação Quarto Elemento teve como alvo dezenas de policiais suspeitos de participar de uma quadrilha especializada em extorsões.

Entre os presos estavam os gêmeos Alan e Alex Rodrigues Oliveira, dois PMs que teriam participado da segurança de agendas da campanha de Flávio ao Senado. Eles são irmãos de Valdenice de Oliveira Meliga, assessora da liderança do PSL na Alerj e tesoureira do partido no estado.

À época, o senador eleito negou ao jornal O Estado de S. Paulo que os policiai s integrassem sua campanha, enquanto Valdenice disse que os irmãos atuavam como voluntários.

Em foto publicada em sua rede social em outubro de 2017, Flávio aparece em foto com o pai, Valdenice e os gêmeos. Na legenda, escreveu: “Parabéns Alan e Alex pelo aniversário, essa família é nota mil!!!”.

Um dos deputados da nova bancada do PSL na Alerj, orientada por Flávio Bolsonaro, também esteve na mira do Ministério Público nas últimas eleições, em função de suposta relação com milicianos de São Gonçalo, região metropolitana do Rio.

O coronel Fernando Salema, segundo investigação do Gaeco (Grupo de Combate ao Crime Organizado) do Ministério Público do Rio, negociou com as milícias da região para organizar um ato de campanha em um reduto dominado pelos grupos. Ele negou envolvimento.

Salema, que já foi comandante de batalhões da PM em Niterói e São Gonçalo, participou de diversas carreatas pela zona oeste do Rio ao lado do senador eleito.

Em 2016, ele aparece em vídeo em um evento, ao lado do então deputado federal Jair Bolsonaro, a quem chamava de “nosso presidente”. Na ocasião, Flávio Bolsonaro, que participava da reunião ao lado do pai e era pré-candidato à Prefeitura do Rio, também foi homenageado pelo comandante do 12° BPM (Niterói).

O presidente Jair Bolsonaro, quando deputado federal, chegou a proferir críticas à CPI das Milícias, realizada pela Alerj. Ele defendeu que alguns policiais militares são confundidos com milicianos por organizar a segurança da própria comunidade, mas que não praticam extorsão.

“Como ele ganha R$ 850 por mês, que é quanto ganha um soldado da PM ou do bombeiro, e tem a sua própria arma, ele organiza a segurança na sua comunidade. Nada a ver com milícia ou exploração de ‘gatonet’, venda de gás ou transporte alternativo. Então, sr. Presidente, não podemos generalizar.”

À época da criação da CPI, em 2008, Flávio Bolsonaro também minimizou a gravidade das milícias. “[O policial militar] É muito mal remunerado, precisa buscar outras fontes e vai então fazer segurança privada, vai buscar atividades que muitas vezes são reprováveis pela opinião pública, pela imprensa”, disse na Alerj.

O então deputado estadual afirmou que “não raro é constatada” a felicidade dos moradores de comunidades supostamente dominadas por milicianos.

“Não raro é constatada a felicidade dessas pessoas que antes tinham que se submeter à escravidão, a uma imposição hedionda por parte dos traficantes e que agora pelo menos dispõem dessa garantia, desse direito constitucional, que é a segurança pública.”

Em 2011, Flávio Bolsonaro também ensaiou explicação para a morte da juíza Patrícia Acioli, morta com 21 tiros por milicianos quando chegava em casa em Niterói (RJ), em 11 de agosto daquele ano. Para o então deputado estadual, a magistrada era rígida demais com policiais —ela era conhecida por atuar no combate a crimes cometidos por milicianos e agentes policiais.

“Que Deus tenha essa juíza, mas a forma absurda e gratuita com q ela humilhava Policiais nas sessões contribuiu p ter mts inimigos [sic]”, escreveu à época no Twitter.

Quatro anos depois, o senador eleito criticou outra juíza agredida por policiais. Em 2015, a Justiça do Rio de Janeiro mandou fechar o Batalhão Especial Prisional da Polícia Militar, após a magistrada Daniela Barbosa ser agredida por um grupo de detentos durante inspeção.

Flávio Bolsonaro disse que a decisão era uma insanidade e apresentou a versão dos policiais, que afirmavam que a juíza os tratava de forma “desumana”. “São policiais militares que estão aguardando o julgamento. Muitos voltarão a trabalhar nas ruas normalmente e ao serem tratados como bandidos por uma pessoa representando o estado se sentiram indignados”, afirmou.

Quando a Alerj abriu uma CPI para investigar os autos de resistência no estado, Flávio foi o único deputado estadual a votar contra. Na ocasião, disse que a CPI seria mais uma “faca na garganta” do policial.

“Vejam como está a cabeça do policial hoje, preocupando-se mais com o Judiciário, com o juiz, por mais que ele esteja certo e amparado pela lei, preocupando-se em produzir provas para que ele não se sente no banco dos réus.”

Da FSP