Alvim foi uma catástrofe ambulante

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Foto: Jorge William/Agência O Globo

Desde que assumiu um cargo no governo do presidente Jair Bolsonaro, o dramaturgo Roberto Alvim, se envolveu numa série de polêmicas. Entre elas, chegou a chamar a atriz Fernanda Montenegro de “sórdida” e “mentirosa”, e foi investigado por tentar empregar sua esposa, Juliana Galdino, quando ainda atuava na Funarte.

A última, causada pela publicação de um vídeo para anunciar o Prêmio Nacional das Artes, levou à sua exoneração, segundo antecipou a colunista Miriam Leitão. Na gravação, ele copia um discurso do ministro nazista Joseph Goebbels para falar de suas pretensões para a arte no Brasil.

Conhecido na cena teatral por suas adaptações de clássicos e obras originais, o dramaturgo ganhou notoriedade para além do meio artístico este mês, quando anunciou nas redes o fechamento do teatro Club Noir, na Rua Augusta, em São Paulo, que inaugurou em 2008 com a mulher, a atriz Juliana Galdino. A suspensão das atividades, segundo Alvim, ocorreu devido ao “linchamento” e “boicote” gerados por seu posicionamento político a favor do presidente Jair Bolsonaro.

Relembre as crises provocadas por Roberto Alvim:

Em junho do ano passado, ao ser anunciado para a diretoria de teatro da Funarte, Alvim publicou um chamado para “artistas conservadores” criarem “uma máquina de guerra cultural”. Em mensagem postada numa rede social, ele convocou profissionais alinhados com “os valores conservadores no campo da arte” a enviar seus currículos.

Segundo Alvim, o objetivo é formar um banco de dados de artistas que serão aproveitados para projetos. Em entrevista ao GLOBO, ele prometeu lutar “pela preservação dos princípios, valores e conquistas da civilização judaico-cristã, contra o satânico progressismo cultural”.

A peça “Res pública 2023”, do grupo teatral Motosserra Perfumada, foi barrada de ocupar um espaço da Funarte em setembro do ano passado pelo então diretor do Centro de Artes Cênicas (Ceacen), Roberto Alvim. A decisão de Alvim de não exibir o espetáulo na Funarte culminou com a exoneração da antiga coordenadora da Funarte em São Paulo, Maria Ester Moreira. O grupo acusou Alvim de censura.

Já dramaturgo argumentou que não havia contrato assinado com o grupo que montaria e encenaria a peça:

— O que eles chamam de censura é curadoria — disse Alvim ao GLOBO na semana passada — Essa carta-denúncia foi recebida dentro da Funarte com completa indiferença.

O caso levou ainda a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, a enviar à Fundação Nacional de Artes (Funarte) um ofício solicitando informações “sobre critérios de ‘qualidade artística'” adotados pelo órgão na escolha das peças teatrais.

Em uma publicação, Alvim chamou a atriz Fernanda Montenegro, de 89 anos, de “sórdida”. A atitude gerou indignação na classe artística, que se manifestou contra as declarações. O ataque de Alvim contra Fernanda foi feito após a atriz posar para a revista literária “Quatro cinco um”. Na edição de outubro da publicação, Fernanda é retratada como uma bruxa prestes a ser queimada em uma fogueira com livros. Artistas e entidades artísticas divulgaram manifestações de repúdio à fala de Roberto Alvim.

Na época, a Associação dos Servidores da Fundação Nacional de Artes (Asserte) publicou um comunicado manifestando “repúdio e imensa indignação frente às declarações proferidas pelo senhor Roberto Alvim, no momento ocupando o cargo comissionado de Diretor de Artes Cênicas da instituição”.

Em setembro, a revista “Veja” publicou reportagem que revelava que Alvim tentou contratar a mulher, Juliana Galdino, para assumir a direção artística, em Brasília, do Projeto de Revitalização da Rede Nacional de Teatros.

A nomeação consistia na realização da primeira parte de um projeto que consistia em “aprimorar e enriquecer a programação artística das atividades de artes cênicas da Funarte”. O passo inicial seria a montagem da peça “Os demônios”, a ser apresentada no Teatro Plínio Marcos. A produtora Flo Produções e Entretenimento, que representa a atriz, receberia R$ 3,5 milhões. Tanto a atriz quanto a produtora foram escolhidos sem licitação.

Em novembro, o presidente Jair Bolsonaro promoveu Alvim a secretário de Cultura, pasta que agora integra o Ministério do Turismo. Alvim foi o responsável por indicar o novo presidente da Funarte, Dante Mantovani, que tomou posse na última segunda-feira e chamou atenção por suas declarações que associavam o rock ao satanismo.

Sérgio de Camargo, que havia sido nomeado presidente da Fundação Palmares, disse que o Brasil tem ‘racismo nutella’ Foto: Reprodução
Sérgio de Camargo, que havia sido nomeado presidente da Fundação Palmares, disse que o Brasil tem ‘racismo nutella’ Foto: Reprodução

Ele também indicou o jornalista e militante de direita Sérgio Nascimento Camargo ao posto de presidente da Fundação Palmares. O jornalista nega a existência de racismo e pede fim do movimento negro. Camargo segue impedido pela justiça de tomar posse do cargo.

Após apenas duas semanas no cargo, a secretária do Audiovisual, Katiane de Fátima Gouvêa, foi exonerada a pedido de Roberto Alvim. Segundo comunicado divulgado pela Secretaria Especial da Cultura, a decisão tomada nesta quarta-feira ocorreu após o secretário Roberto Alvim tomar conhecimento de um parecer do Ministério Público Eleitoral com a reprovação das contas de Katiane quando ela foi candidata a deputada federal.

O clima durante a reunião em que Alvim comunicou a decisão foi tenso, segundo relatos de pessoas ligadas à pasta. Katiane teria se exaltado, gritado e teve que ser contida e retirada por seguranças do prédio onde fica a Secretaria da Cultura.

Ao GLOBO, Katiane afirmou que foi retirada “simplesmente por não concordar com a gestão do Alvim”.

— Se eu tivesse cometido alguma irregularidade, meu nome não teria passado pelo crivo da Casa Civil, que analisa a vida pregressa dos postulantes ao governo — disse.

Em dezembro do ano passado, o governo federal mudou o teto da Lei Federal de Incentivo à Cultura, popularmente conhecida como Lei Rouanet, de R$ 1 milhão para R$ 10 milhões para espetáculos musicais. Mas uma imprecisão no decreto gerou dúvidas nos produtores culturais, porque a redação do texto não se referia apenas a esta modalidade específica de espetáculo. Por ela, o novo teto dependeria apenas da natureza da empresa, e não do projeto.

Especialistas ouvidos pelo GLOBO afirmam que, pelo novo texto, não ficava claro se festivais, por exemplo, deixariam de ter o teto de R$ 6 milhões. Isso porque o parágrafo que limitava o valor para este tipo de evento não foi alterado. Consultada, a Secretaria Especial de Cultura chegou a afirmar que a mudança seria, sim, para todos. Porém, no mesmo dia, a reportagem foi avisada de que a mudança valerá apenas para espetáculos musicais e que, por isso, uma nova IN será publicada em janeiro.

 O Globo