Por que Alckmin não trairá Lula
Por que Alckmin não trairá Lula
Eduardo Guimarães
A síndrome do vice golpista entranhou-se no imaginário da esquerda depois que — ó, que surpresa! — Michel Temer traiu Dilma Rousseff* após as ‘burradas’ de junho de 2013 extirparem metade da aprovação dela nas duas primeiras semanas de protestos.
Não seria para menos. Nas manifestações dos vinte centavos, o PT apanhava quase sozinho. Tanto que o então governador Geraldo Alckmin**, que também aumentara em vinte centavos o preço da passagem do metrô, caiu bem menos que Dilma e que o então prefeito Fernando Haddad**.
Dilma caiu 27 pontos nas três primeiras semanas de junho de 2013, a maior queda de aprovação de um governante até então conhecida. Foi de 57% em 1o de junho de 2013 para 30% no dia 29 do mesmo mês, segundo o Datafolha.
Fernando Haddad caiu 16 pontos percentuais, indo de 34% em 1o de junho de 2013 para 18% no dia 1o de julho de 2013. E Geraldo Alckmin caiu 14 pontos, de 52% no dia 1o de junho de 2013 para 38% no dia 1o de julho de 2013. Sempre segundo o Datafolha.
Com efeito, Dilma caiu 27 pontos, Haddad caiu 16 pontos e Alckmin caiu 14 pontos.
O mais interessante é que Dilma nada tinha que ver com o aumento do preço das passagens de ônibus e metrô em São Paulo e, assim mesmo, caiu quase o dobro que os responsáveis pelos aumentos de ônibus e metrô na capital paulista.
Isso ocorreu porque as manifestações do Movimento Passe Livre acusavam diretamente Dilma Rousseff, Fernando Haddad e o PT e sequer mencionavam Alckmin, que caiu nas pesquisas graças ao fato de que parte dos revoltados com os vinte centavos lembraram que ele também aumentara a tarifa do metrô.
Foi ali, porém, que Haddad e Alckmin se aproximaram e, agora se sabe, estabeleceram uma relação que dura até hoje. E foi dessa relação que nasceu a ideia de o ex-governador tucano se aliar a Lula e integrar sua chapa à Presidência.
Essa decisão, porém, produziu um dos mais ruidosos rachas no PT. A dita “ala esquerda” do partido decidiu, simplesmente, não aceitar a aliança e tratou de tentar criar uma situação de facto, irreversível, com ataques ferinos.
Alckmin foi chamado pela esquerda petista (isso existe, a esquerda da esquerda) de “ladrão de merenda”, “ditador”, “assassino” e, contra ele, fizeram um abaixo-assinado que reuniu mais de mil assinaturas de militantes do partido. Além disso, chegaram a propor uma “CPI” contra o ex-governador… (?!)
Mas o que mais se ouviu falar sobre a oposição dessa ala petista à chapa Lula-Alckmin foi em relação a um suposto-provável-quase-certo golpe a la Temer que o ex-governador daria em Lula para tomar o seu lugar na Presidência.
Lula saiu dessa como um apoiador de ladrões de merenda e ingênuo como um recém-nascido. Mas como ele é tudo que a esquerda tem para salvar a todos nós de um segundo desgoverno Bolsonaro, a aliança com Alckmin saiu e todo mundo acabou batendo palmas.
Mas e Alckmin, vai dar golpe? Existe esse risco? Como ninguém tem uma bola de cristal que funcione de fato para prever o futuro, o que se pode fazer é analisar como e por que Alckmin faria isso.
Temer pegou carona na popularidade de Dilma. Era preciso um amplo acordo para interromper a Lava Jato, que é o que Eduardo Cunha e o resto do Centrão queriam de Dilma e ela recusou. Assim, era preciso alguém para fazer isso no lugar dela. Inventariam um motivo para derrubá-la e o seu sucessor, correligionário de Cunha e do Centrão, Michel Temer, o vice, faria o serviço.
Não fez. Não havia o que fazer. Dilma não teria conseguido parar a Lava Jato nem que quisesse… Mas Temer, que não é bobo, fez Cunha acreditar que conseguiria. E, então, presidente da Câmara acabou na cadeia.
Ou seja, Temer foi o único que se deu bem. E a Presidência caiu no colo dele.
Alckmin precisaria de um complô desse calibre, que não acontece duas vezes no mesmo século. Além disso, o que ele quer é renovar sua carreira política. E por cima, com Luiz Inácio Lula da Silva, o político mais popular do Brasil.
Alckmin afundou em 2018. Os tucanos, que sempre chegavam ao segundo turno contra Lula com pelo menos uns 30% dos votos válidos, caiu fora no primeiro turno com a votação vexatória de 4,76%. E a culpa não foi dele…
O eleitorado do PSDB sempre foi de extrema-direita. Os tucanos apelaram a esse eleitorado para tentarem vencer o PT neste século, sem nunca conseguirem.
O fato é que o eleitorado brasileiro médio de direita não é moderado; a grande maioria é extremista de direita. E em havendo um extremista de direita autêntico, um “mito” fascista como Bolsonaro, sumiu o espaço do PSDB na extrema-direita e o partido foi literalmente miniaturizado.
Alckmin pode ser o sucessor de Lula. Até por isso tem lutado para eleger Haddad governador. Com isso, em 2026 o ex-tucano poderá muito bem ser apoiado por Lula e pelo PT, já que o ex-presidente terá mais de 80 anos e Haddad estará feliz da vida governando o maior Estado da Federação.
Como Lula disse, vencer a eleição para presidente e para governador de São Paulo dará ao PT dois países para governar.
Alckmin será fiel e amigo de Lula e, se tudo der certo, poderá se tornar o herdeiro de um dos maiores patrimônios políticos que já existiram neste país, se não o maior de todos. Por isso o “Picolé de Chuchu” não dará golpe em Lula. Não faria sentido.
*https://datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2013/06/1303659-aprovacao-a-governo-dilma-rousseff-cai-27-pontos-em-tres-semanas.shtml
**https://datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2013/07/1304326-avaliacao-de-alckmin-no-estado-e-hadda-na-capital-sofre-queda.shtml
Eduardo Guimarães é editor do Blog da Cidadania