Lula cita tragédia no RS e pede aliança global pelo clima

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Foto: Reprodução

Citando as vítimas do ciclone que atingiu o Sul do Brasil nos últimos dias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou seu discurso de abertura na cúpula do G20, em Nova Deli, para cobrar dos países ricos que cumpram suas promessas de ajudar os emergentes a lidar com as mudanças climáticas, enquanto apresenta dados de que o desmatamento na Amazônia caiu.

Ele ainda anunciou que, na presidência do grupo em 2024, o Brasil irá lança uma mobilização internacional para tentar lidar com a questão do meio ambiente e clima.

“O descompromisso com o meio ambiente nos leva a uma emergência climática sem precedentes”, disse Lula. “O aquecimento global modifica o regime de chuvas e eleva o nível dos mares. As secas, enchentes, tempestades e queimadas se tornam mais frequentes e minam a segurança alimentar e energética”, afirmou.

Como exemplo, o presidente usou o desastre natural no Sul do Brasil, que deixou dezenas de vítimas.

“Agora mesmo no Brasil, o estado do Rio Grande do Sul foi atingido por um ciclone que deixou milhares de desabrigados e dezenas de vítimas fatais”, afirmou. “Se não agirmos com sentido de urgência, esses impactos serão irreversíveis”, insistiu.

Lula foi cobrado pela oposição pelo fato de não ter ido ao Sul. No G20, sua presença era considerada como obrigatória, já que o Brasil assume a presidência do grupo.

Na cúpula, o tom usado por Lula e suas iniciativas deixaram claro que o tema ambiental será uma das prioridades do governo, quando o Brasil assumir o G20 em dezembro. Para diplomatas estrangeiros, a iniciativa é considerada como uma tentativa do brasileiro de se reposicionar como protagonista no debate climático, depois de anos de negacionismo por parte de Jair Bolsonaro.

Mas a ofensiva brasileira não se limita aos discursos e vem permeada por cobranças aos países desenvolvidos.

Nos bastidores, o governo insiste que, na declaração final da cúpula deste fim de semana, uma referência explícita seja feita às barreiras comerciais estabelecidas pela Europa, usando o argumento ambiental. Pela regra, produtos que tenham promovido um desmatamento recente sofreriam tarifas mais altas para entrar no mercado europeu.

Nos últimos dias, enquanto o G20 era preparado, o Brasil foi um dos 16 países que enviou aos europeus uma carta na qual denuncia a lei, enquanto no Ministério do Desenvolvimento, Comércio e Indústria, não se exclui que o governo acione a OMC contra a nova regra europeia. No ano passado, sob Bolsonaro, a mesma carta já havia sido enviada, sem resultados.

Lula ainda tem insistido em criticar a UE, chamando a iniciativa de “neocolonialismo verde”. No G20, uma vez mais, o tema estará no debate do presidente com líderes estrangeiros.

Há poucas semanas, na cúpula do Brics, o brasileiro deu o tom do que seria sua reação aos europeus.

“Não podemos aceitar um neocolonialismo verde que impõe barreiras comerciais e medidas discriminatórias, sob o pretexto de proteger o meio ambiente”.
Luiz Inácio Lula da Silva

O governo brasileiro já deixou claro que a “punição” não pode ser a forma de lidar com o meio ambiente entre países.

Para os governos do G20, ainda que radicalmente diferente de Bolsonaro, o posicionamento brasileiro agora também significa que a agenda virá repleta de cobranças e uma coordenação entre economias em desenvolvimento. Nos bastidores, o Brasil tem organizado essa frente com os demais países emergentes, que também insistem em responsabilizar as economias ricas.

Em seu discurso neste sábado, o brasileiro ainda voltou a destacar que a questão climática tem um responsável claro: o mundo desenvolvimento.

“Os efeitos da mudança do clima não são sentidos por todos da mesma forma. São os mais pobres, mulheres, indígenas, idosos, crianças, jovens e migrantes, os mais impactados”, disse.

Sua escolha, porém, foi por colocar a responsabilidade nos países ricos.

“Quem mais contribuiu historicamente para o aquecimento global deve arcar com os maiores custos de combatê-la”, disse. “Esta é uma dívida acumulada ao longo de dois séculos”, insistiu.

Segundo ele, desde a COP de Copenhague em 2009, “os países ricos deveriam prover 100 bilhões de dólares por ano em financiamento climático novo e adicional aos países em desenvolvimento”.

Mas alertou: “essa promessa nunca foi cumprida”.

Lula ainda mandou um recado aos europeus e americanos sobre as futuras negociações. “De nada adiantará o mundo rico chegar às COPs do futuro vangloriando-se das suas reduções nas emissões de carbono se as responsabilidades continuarem sendo transferidas para o Sul Global”, disse.

Segundo ele, recursos não faltam. “Ano passado, o mundo gastou 2,24 trilhões de dólares em armas. Essa montanha de dinheiro poderia estar sendo canalizada para o desenvolvimento sustentável e a ação climática”, defendeu.

O brasileiro optou por usar praticamente todo seu discurso de abertura para insistir sobre a questão climática e sinalizar que esse será um dos temas prioritários quando o Brasil assumir a presidência do G20, a partir de dezembro.

Lula defendeu que o G20 impulsione esse esforço, respeitando o conceito de responsabilidades comuns, porém diferenciadas e valorizando todas as três convenções da Rio 92: de clima, biodiversidade e desertificação. “A melhor forma de sermos ambiciosos é garantir o sucesso do Exercício de Avaliação Global do Acordo de Paris, na COP28, e da negociação de novas metas quantitativas”, insistiu.

Segundo ele, o Brasil vai lançar, durante a presidência do G20, uma Força Tarefa para Mobilização Global contra a Mudança do Clima.

“Queremos chegar na COP 30, em 2025, com uma agenda climática equilibrada entre mitigação, adaptação, perdas e danos e financiamento, assegurando a sustentabilidade do planeta e a dignidade das pessoas”, disse. “Esperamos contar com o engajamento de todos. Para que a beleza da Terra não seja apenas uma fotografia vista do espaço”, insistiu.

Para o Brasil, um dos caminhos é o estabelecimento de acordos entre o Sul Global e os países ricos. Neste domingo, uma aliança será anunciada entre Brasil, Índia e Estados Unidos, além de outros 16 países. Trata-se de um plano sobre o potencial dos biocombustíveis como alternativa aos combustíveis fósseis e a experiência bem-sucedida de quatro décadas no uso do etanol no Brasil e em outros locais.

O primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, Lula e Joe Biden assinam o acordo que cria a Aliança Global pelos Biocombustíveis. O projeto, porém, foi questionado pela Europa. “Cerca de 3 bilhões de pessoas no mundo podem ser beneficiadas pela descarbonização de seus países com a adoção dos biocombustíveis. Para isso, é fundamental que tenhamos um trabalho de cooperação global para dar tração a essa que será uma das rotas de carbonização adotadas pelo mundo”, afirma Evandro Gussi, presidente da União da Indústria da Cana-de-açúcar e Bioenergia (UNICA).

Lula ainda usou a abertura do G20 para insistir que, ao contrário do que estava ocorrendo nos anos de Jair Bolsonaro, o governo estava agindo para reduzir o desmatamento.

“No Brasil, estamos fazendo nossa parte. A proteção da floresta e o desenvolvimento sustentável da Amazônia estão entre as prioridades do meu governo. Nos primeiros 8 meses deste ano reduzimos o desmatamento em 48% em relação ao mesmo período do ano passado”, disse.

Lula ainda apontou para a realização da Cúpula da Amazônia e a nova agenda de colaboração entre os países que fazem parte daquele bioma, ainda que sem citar o fato de que consensos não foram possíveis entre os sul-americanos sobre diversos aspectos da agenda ambiental. Lula tampouco mencionou o fato de ser favorável à exploração de petróleo na região.

Segundo ele, o Brasil está aprofundando o diálogo com outros países detentores de florestas tropicais da África e da Ásia, para articular posições comuns entre as bacias Amazônica, do Congo e do Bornéu-Mekong.

Parte do discurso do brasileiro ainda foi focado na necessidade de que as pessoas que vivem na região sejam atendidas.

“Não basta olhar as fotos de satélite. Debaixo de cada árvore, há uma mulher, um homem e uma criança. As energias renováveis, os biocombustíveis, a socio-bio-economia, a indústria verde e a agricultura de baixo carbono devem gerar empregos e renda, inclusive para as comunidades locais e tradicionais”, disse.

Uol