Ex-tucano é principal doador do novo partido de Bolsonaro

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Foto: Werther Santana/Estadão

Principal operador político do Aliança pelo Brasil, o partido que o presidente Jair Bolsonaro tenta criar, o advogado Luís Felipe Belmonte dos Santos foi, até recentemente, filiado ao PSDB, fez doações para legendas de esquerda, como PCdoB, e atuou como advogado do empresário Luiz Estevão, que cumpre uma pena de 26 anos por fraudes na construção do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo.

Apesar de ter perfil que destoa do bolsonarismo clássico, Belmonte, de 66 anos, conquistou em pouco tempo um lugar no restrito circulo íntimo do clã e assumiu o papel que um dia foi do também advogado Gustavo Bebianno, hoje desafeto da família. No organograma do partido em formação, ele é o terceiro nome, abaixo apenas do presidente e do senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ).

Desconhecido dos bolsonaristas, Belmonte se encontrou pessoalmente com o presidente em fevereiro, no almoço de aniversário do cantor Amado Batista. Na ocasião, o contato foi protocolar. O primeiro encontro de fato entre os dois se deu apenas no dia 19 de novembro, no Palácio do Planalto, e teve a participação dos advogados Karina Kufa e Admar Gonzaga, que assumiram a missão de definir o destino do presidente após ele deixar o PSL.

“Ele conhecia alguns dirigentes de partidos pequenos e tinha algumas opções”, disse Karina. Depois, quando se constatou que o melhor caminho para o presidente era criar a própria agremiação, Belmonte seguiu ajudando. “Ele acabou ficando envolvido com o projeto e realmente se jogou”, afirmou a advogada, que foi quem “descobriu” o novo aliado.

Belmonte desembarcou em Brasília em janeiro do ano passado, após um período sabático de oito anos na Inglaterra – onde aprendeu inglês e foi a shows de rock –, disposto a gastar parte de sua fortuna de R$ 65,8 milhões para entrar na política com a mulher, Paula Belmonte.

Antes da temporada britânica, foi convidado para tentar uma vaga no Congresso em 1994 por Luiz Estevão e declinou, mas mantém até hoje, segundo ele, uma relação “cordial” com o ex-senador. O vice-presidente da Aliança advogou para Estevão em diversas ações, inclusive no processo em que a Vara de Falências e Concordatas do Distrito Federal determinou, em 2005, a falência do Grupo OK, do qual era sócio.

Suplente. Belmonte se filiou no ano passado ao PSDB e entrou na disputa pelo Senado como suplente do tucano Izalci Lucas (DF), que foi eleito. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o advogado doou R$ 1,48 milhão para a campanha. Izalci é hoje cotado para assumir um ministério, o que abriria espaço para Belmonte no Senado. A ideia é ventilada na cúpula bolsonarista.

“Me filiei ao PSDB porque estava junto com o Izalci, que me chamou para o partido. Foi uma questão estratégica. Eu respeito muito o PSDB. É um partido que tem bons quadros, apesar de eu não ser adepto da social-democracia”, afirmou Belmonte, que se desfiliou da sigla.

Já Paula foi para o Cidadania (antigo Partido Popular Socialista), legenda pela qual foi eleita deputada federal. Ao todo, o advogado doou R$ 3,95 milhões para várias candidaturas, do PCdoB ao DEM, sendo o segundo maior doador das eleições de 2018, atrás apenas do empresário Rubens Ometto, da Cosan. “Tínhamos que buscar um grupo. A indicação para o Cidadania foi do senador Reguffe (Podemos-DF), mas eu não me adaptava nesse espectro. Sou de família militar. Meu pai é militar e eu era afinado com o ideário do movimento do Bolsonaro”, disse Belmonte.

Questionado se a doação de R$ 10 mil para o PCdoB pode ser usada contra ele por adversários de Bolsonaro, o advogado afirmou que apoia ideias e pessoas, e não partidos. “Eu combato muito fortemente tudo aquilo que veio de decálogo de Lenin e do Foro de São Paulo. Não combato pessoas, mas ideias inadequadas.”

Os seguidores do presidente minimizam a doação para o partido que é a antítese do bolsonarismo. “Todo mundo pode se redimir”, disse a deputada Carla Zambelli (PSL-SP).

Dono do escritório Luís Felipe Belmonte e Advogados Associados, que inicialmente era Belmonte Advocacia, o vice-presidente do Aliança atua, em grande parte, em processos que chegaram ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a União e, por isso, o embate jurídico é feito contra a Advocacia-Geral da União (AGU).

Assinaturas. O maior desafio de Belmonte agora é certificar cerca de 492 mil assinaturas em pelo menos nove Estados até abril, a tempo de a legenda disputar as eleições municipais. A primeira aposta foi a certificação eletrônica autorizada pelo TSE, que pode custar até R$ 330. Isso não seria um problema. Na quinta-feira, Belmonte afirmou ao Estado que o Aliança recebeu de uma empresa a doação de 1 milhão de assinaturas eletrônicas gratuitas. “E já tem outro grupo oferecendo 500 mil. O custo para nós será zero. Teria de fazer apenas o registro da assinatura eletrônica e já no mesmo ato faz o apoiamento. Empresas da área de certificação eletrônica têm interesse em fazer a divulgação do trabalho deles”, disse o advogado na ocasião.

Mas, como o processo não foi regulamentado, a possibilidade desse modelo é remota e os bolsonaristas se aliaram a líderes evangélicos e corporações militares para tentar atingir a meta de assinaturas físicas. “Temos entidades ligadas a grupos militares que envolvem 900 mil pessoas, sendo que estrutura militar é muito hierarquizada e capilarizada. É um comando e as coisas são atendidas. O Corpo de Bombeiros está em todos os municípios”, afirmou Belmonte.

Apesar de ser “cristão novo” no bolsonarismo, ele tem discurso afinado com o do presidente. “Nosso estatuto fala em desenvolvimento sustentável, mas os ‘ecoxiitas’ e os ‘biodesagradáveis’ levam tudo tão ao pé da letra que não se pode cortar um capim. Faz quanto tempo que as ONGs estão na Amazônia? 50 anos. E por que a Amazônia está do jeito que está, com os índios miseráveis? Há interesse em manter miseráveis para justificar as ONGs que recebem dinheiro?”

O advogado questionou o fato de a Amazônia concentrar mais ONGs que o Nordeste e disse que as organizações têm um plano de internacionalização da região. “Existem casos de tribos de índio que falam inglês. Há movimentos de internacionalização da Amazônia.”

Mas há também pontos discordantes. “Não notei na formação do programa do partido a influência acentuada olavista. Alguns pontos, sim, como princípios de família e combate ao Foro de São Paulo. Olavo de Carvalho não será a tônica do novo partido”, disse o advogado em referência ao filósofo e guru bolsonarista.

Estadão