Após 2 meses do crime em Brumadinho, outras comunidades correm risco
“Desde o dia 8 de fevereiro eu não vou mais trabalhar porque eu não tenho coragem de sair de casa e deixar meus três filhos e meus pais, que são idosos, sozinhos e com o risco de romper essa barragem”, desabafa Adriana Dutra, moradora de Barão de Cocais, município a região central de Minas Gerais. A casa da operadora de caixa está no mapa de margem da lama, área que será possivelmente atingida caso a barragem Sul Superior, da mina Gongo Soco, se rompa. O estudo foi divulgado no domingo (24) pela Defesa Civil, após o nível de risco da estrutura subir de 2 para 3, último indicador antes do colapso.
Nesta segunda-feira (25) os moradores da cidade vão realizar, pela primeira vez, o treinamento da rota de fuga, para o caso de rompimento. Cerca de 6 mil pessoas vão ser treinadas para deixar o local.
Para evitar situações como a vivenciada em Barão de Cocais, o Ministério Público de Minas Gerais emitiu uma recomendação à Companhia Siderúrgica Nacional – CNS, responsável pela barragem Casa de Pedra, em Congonhas, também na região central do estado. O empreendimento é classificado como Classe 6 pela Agência Nacional de Águas (ANA), a mais alta em categoria de risco, e tem cinco vezes mais o volume da que rompeu em Brumadinho.
O documento, expedido pelo promotor de justiça Vinícius Alcântara Galvão, recomenda a remoção dos cerca de 2500 moradores, dos bairros Cristo Rei e Residencial Gualter Monteiro. De acordo com estudos do próprio MP, em caso de rompimento da barragem o local seria atingido em menos 30 segundos.
O promotor exige, entre outras ações, o pagamento de aluguel para as famílias, auxílio financeiro e solução, em caráter emergencial, para o fechamento da creche Dom Luciano e da Escola Municipal Conceição Lima Guimarães, que deixaram de atender mais de 200 crianças por causa do risco de rompimento da barragem.
Alcântara afirma que é preciso resolver a situação dos moradores antes que se chegue a um nível crítico. Para ele, a ação também poderia ser adotada por outras promotorias. “São situações de desgastes provocadas por uma atividade privada altamente lucrativa, que tornou insuportável a vida daquelas pessoas ali. Então, os atingidos precisam ser ressarcidos e retirados daquele local. A remoção precisa ser pela dignidade da pessoa humana e não pelo caráter emergencial”, ressalta.
Pablo Dias, da coordenação do Movimento dos Atingidos Por Barragens (MAB), destaca que um diferencial da recomendação é que os moradores têm poder de decisão sobre o processo, o que não é possível quando são evacuações emergenciais. “Esses processos de remoção têm sido feitos de forma confusa, sem preparação e informações básicas aos moradores. A evacuação ou remoção tem que ser feita de forma cuidadosa, bem informada e processual. Para garantir tanto a qualidade de informação quanto a possibilidade de decisão dos atingidos”, avalia.
A mineradora tem até terça-feira (26) para responder à recomendação do MP. Caso não seja aceita, o promotor afirma que ações serão tomadas em defesa dos moradores. “É um pleito da população, elas querem viver sem medo. Nós construímos essa recomendação em conjunto. O direito se constrói é na prática, se não for atendido o pedido nós vamos entrar com uma ação civil pública”, adianta.
Neste 25 de março, o crime da Vale em Brumadinho completa dois meses. Até o momento 214 mortes foram confirmadas, 91 pessoas seguem debaixo da lama. Pela manhã os atingidos realizaram um ato em solidariedade às famílias das vítimas. Ao meio dia um ato ecumênico foi celebrado em memória das vítimas. Para a tarde, às 17h30, está prevista uma caminhada saindo da Praça da Bandeira, no centro da cidade rumo ao trevo de Brumadinho.