Estreante do NOVO na ALESP critica aumento para professores e os chama de bêbados
ilho de um contínuo e de uma diarista, o mais novo entre 11 irmãos de uma família pobre, Daniel José dinamitou as estatísticas.
Ele saiu da periferia de Bragança Paulista (SP), foi cursar economia no Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa), em São Paulo, e fez mestrado em relações internacionais pela Universidade de Yale, nos Estados Unidos, além de um intercâmbio na Suíça e uma temporada de nove meses na Jordânia como voluntário em uma ONG que acolhe sírios refugiados de guerra. Uma guinada de vida graças à educação.
Trainee do banco JP Morgan e, depois, da M Square, uma das gestoras de investimentos mais respeitadas do país, aquele jovem de família humilde tinha tudo para decolar a carreira no mercado financeiro e construir um networking de gente endinheirada e influente. Mas, como diz Daniel, “não fazia sentido estar ali”.
Aos 29 anos, Daniel deixou o mundo corporativo, recusou proposta para trabalhar em Nova York e, em abril de 2017, decidido primeiramente a ser deputado federal, começou a rodar o Brasil como palestrante.
No meio do caminho recalculou a rota e encontrou um atalho para ingressar na política: a Assembleia Legislativa de São Paulo. Eleito com 183 mil votos, o sexto colocado, Daniel é o candidato do Novo à presidência da Casa.
“No mercado eu ganhava bem, estava do lado de gente boa e aprendia muitas coisas. Sentia a falta de ver que o meu trabalho não tinha impacto direto na vida das pessoas”, conta.
Segundo ele, essa inquietude é o que o levou até a Jordânia em 2012. “Foi uma experiência incrível, no Brasil não damos valor para democracia. Convivi com pessoas torturadas, familiares raptados e que recebiam, em caixa de sapato, um pedaço do desaparecido.”
Para a campanha de deputado estadual, o jovem desconhecido obteve doações de pessoas físicas, no total de R$ 939 mil, e foi capitaneado por Eduardo Mufarej, residente da Somos Educação e sócio da Trapon —um fundo de investimento bilionário que, desde 2014, detém parte do controle da BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão.
Em outubro de 2017, com a ajuda de outros empresários, Mufarej criou a rede Renova Brasil, que oferece cursos e bolsas, acima de R$ 5.000, para a formação de candidatos com o desejo de mudar o perfil do Legislativo. Para isso, o candidato precisa ter 21 anos, ser ficha limpa e passar por um processo seletivo –testes online, entrevistas e avaliação presencial.
Daniel furou a fila e deixou Mufarej encantado com a sua história de vida e empatia. Acolhido no Renova, o candidato teve aulas de estratégia eleitoral e treinamento de como lidar com a imprensa.
O investidor também recorreu aos seus contatos para reforçar o caixa da campanha. Parceiros de Mufarej, Abílio Diniz deu R$ 50 mil e José Carlos Reis de Magalhães Neto, o Zeca, injetou R$ 70 mil.
“O Daniel tem uma mobilidade cívica acima da média. Sabia da realidade dele, não era rico e não tinha patrimônio, achei muito legal a disposição dele em entrar para a política. Eu quis ajudá-lo, e o Daniel foi meu primeiro funcionário no Renova”, afirma Mufarej, que apresentou Daniel para seus amigos, donos de escolas e executivos, como um palestrante promissor.
Daniel criou um personagem para ministrar suas palestras. Sempre de calça jeans, camiseta básica e boné, em algumas vezes com a aba para trás, recorria a gírias para chamar a atenção dos jovens.
“Os alunos gostavam de ouvi-lo, estavam diante de um cara que estudou no Insper, em Yale e morou em um campo de refugiados. Ele transmite uma mensagem de resiliência, superação”, disse Mufarej.
Daniel não leva a fama de um bom aluno. O adolescente franzino preferia futebol aos cadernos em Bragança Paulista e começou a conviver com a leitura de uma maneira forçada, mais precisamente em Yale, onde precisou conhecer clássicos como Carl von Clausewitz e Nicolau Maquiavel.
“Foram dois anos fantásticos, em Yale, que mudaram o meu mundo. É um nível muito diferente do Brasil, estava assistindo aula com um amigo e logo descobri que o cara era neto do John Kennedy, e o meu avô cortava cana no Paraná”, disse. “Esse é o poder da educação.”
Daniel e os seus irmãos estudaram em um colégio particular em Bragança Paulista, o IECJ (Instituto Educacional Coração de Jesus), graças a bolsas de estudos oferecidas por uma tia paterna, a freira Benedita.
“O IECJ ensinava mais sobre a vida e não olha para o vestibular. Mas já foi uma sorte estudar em uma escola minimamente boa, porque na rede pública os alunos não aprendem nem as operações básicas de matemática, muito menos regra de três”, diz o novo deputado estadual paulista.
O irmão gêmeo Gabriel José da Silva Oliveira recorda, emocionado, que, no terceiro ano do ensino médio, Daniel colocou a foto de uma universidade na porta do guarda-roupa, não soube precisar qual delas, e escreveu abaixo: “Vou estudar lá”.
“Na escola sempre tivemos dificuldades na hora de comprar material, livros, e nossos pais davam a vida. No fim, eles conseguiam de uma forma ou outra, seja com doação, empréstimo”, afirma o irmão, graduado em sistemas de informação na PUC-RS, também com uma bolsa de estudo.
“Ao mesmo tempo a gente estuda com colegas de melhor nível financeiro, até cultural, então aquilo tudo despertou que, para reverter nossa situação, seria estudando.”
Daniel prestou vestibular para economia na Fundação Getúlio Vargas e no Insper, onde ganhou uma bolsa com descontos de 80% na mensalidade em 2006.
Aos 18 anos, deixou Bragança Paulista (a 85 km da capital paulista) e, por sorte, não gastaria com moradia em São Paulo. Um dos irmãos morava em Diadema, na região metropolitana, e Daniel gastava duas horas para chegar até a faculdade, na Vila Olímpia (zona oeste).
Para conseguir pagar os 20% restantes da mensalidade, na época R$ 400, conta que teve dia em que ia dormir com estômago vazio. “Eu podia gastar, em média, R$ 10 por dia. Então almoçava muita salada nos restaurantes por quilo, teve dia em que a refeição era só pão de queijo, foram muitos perrengues.”
No decorrer do primeiro ano do curso de economia, bateu nas portas da Fundação Estudar e, aprovado em um processo seletivo, conseguiu o financiamento de 100%. No segundo ano, trancou a matrícula e foi fazer um intercâmbio na Suíça. De volta ao Brasil, concluiu o curso em 2010.
Daniel José assume uma das cadeiras de deputado no próximo dia 15 e promete que tratará a educação pública como prioridade. Ele defende o projeto Escola sem Partido.
À Folha o deputado afirma que é hora de passar um “pente-fino nos professores”. Segundo ele há uma parte má intencionada, enquanto os alunos vão de mal a pior.
“O estado de São Paulo é o segundo maior empregador do mundo. Se aumentar o salário do professor em R$ 10, o orçamento explode. Vamos separar o joio do trigo, tem professor que vai dar aula bêbado”, afirma.
“A rede estadual tem 200 mil professores, mas funciona tranquilamente com 20 mil. O professor usa 30% do seu tempo para preparar aula, está mais preocupado em assistir Sessão da Tarde, nem é Netflix. As pessoas podem contar com meu sangue, suor e lágrimas, vamos comprar a briga para educar melhor os alunos.”
Daniel promete que vai propor um treinamento para os diretores enquadrarem professores “que não têm interesse”.
Outra intenção é promover uma espécie de censo para que o estado conheça melhor os alunos e suas necessidades.
Daniel defende, por exemplo, que o período noturno deverá ficar disponível somente para quem, de fato, precisa trabalhar. “Aprende muito menos à noite, só 20% trabalham.”
Perfil
Idade 31 anos
Nascimento Bragança Paulista (SP)
Partido Novo
Gênero Masculino
Estado civil Solteiro
Cor/raça Branca
Grau de instrução Superior completo
Ocupação Economista
Reeleição Não
Descrição dos bens declarados do parlamentar Veículo automotor terrestre, depósito bancário em conta corrente no país, fundos e aplicações de renda fixa
Valor declarado dos bens R$ 188.084,78
Da FSP