Filme com último discurso de Lula antes da prisão será exibido em festival francês
O curta documental De Longe, Ninguém Vê o Presidente, que aborda o último discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em abril de 2018, antes de ser levado para Curitiba, onde se encontra preso há quase um ano, será exibido nesta sexta-feira (29) no Festival Cinélatino – Rencontres de Toulouse, na França. Dirigido por Rená Tardin e produzido por Felipe Haurelhuk, o filme compõe sessão especial de curtas documentais intitulada Brasil: Resistência, que debate o atual contexto social e político do país.
Segundo Tardin, os eventos que se desenrolaram em São Bernardo do Campo, quando o ex-presidente decide ir até a sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, após a decretação da prisão pelo então juiz Sergio Moro, prenunciavam o momento de ruptura pelo qual passaria o país ao longo de 2018, culminando com a eleição de Jair Bolsonaro (PSL).
“Quando vi a notícia de que Lula seria preso, pensei logo em documentar. Estávamos caminhando, naquele ano de 2018, para uma mudança muito grande de paradigmas”, diz o diretor. “Agora, que a gente tem um governo ligado a extrema-direita, está todo mundo tentando entender o que está acontecendo por aqui. O filme não dá conta desse todo, mas joga luz sobre algumas dessas questões”, diz Tardin, sobre a exibição da obra no festival francês.
O filme traz imagens do histórico discurso de Lula durante aquele sábado, 7 de abril, e dos apoiadores que, dois dias antes, já ocupavam os arredores do sindicato, berço político do ex-presidente. “Parte da democracia brasileira a gente deve a esse sindicato. Aqui foi minha escola. Aqui aprendi sociologia, economia, física, química, e aprendi a fazer muita política.” Lula já afirmou que, quando tinha dúvidas sobre alguma decisão a tomar, consultava os mais de 140 mil “professores”, se referindo aos trabalhadores metalúrgicos.
“Foram dias de convulsão. A mídia perdeu espaço de diálogo com as esquerdas também. Tudo foi uma coisa meio fria, meio distante. Realmente me parecia o fim de uma era, de um ciclo. Era importante estar perto, nesse momento”, relata o diretor.
O filme mescla também imagens de arquivo das greves no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, lideradas por Lula, com cenas da São Bernardo atual, nos mesmo locais onde ocorreram aqueles eventos históricos. Nas montadoras, os trabalhadores perdem espaço para a automação. “Ao mesmo tempo, o trabalhador atualmente sofre com a precarização. O que a gente faz do trabalho daqui para frente? Cada vez mais, a gente trabalha em condições piores”, diz.
Para Haurelhuk, o avanço da tecnologia nas fábricas é símbolo de certo “esfriamento” das relações em toda a sociedade e o afastamento entre as pessoas. “De uma certa forma, esse esfriamento acabou levando a tudo o que aconteceu no país nos últimos anos, culminando com a prisão do ex-presidente. De longe ninguém vê muita coisa. Ninguém vê o sindicato. De longe, ninguém vê a própria família. O recado que a gente quis passar é que é preciso estar perto.”
Com obras como O ABC da Greve, de Leon Hirzman, e Noite e Neblina, de Alain Resnais, como referências para os cineastas, De Longe, Ninguém Vê o Presidente estreou em dezembro no Festival de Havana, e deve seguir no circuito de festivais nacionais e internacionais. A estimativa dos produtores é que o filme esteja disponível publicamente na internet a partir do ano que vem.
Do RBA