Lava Jato atribui a Temer a liderança de organização criminosa há mais de 40 anos
No pedido de prisão do ex-presidente Michel Temer (MDB), a força-tarefa da Lava Jato afirmou que o esquema atribuído ao emedebista ‘se valeu de poder político para transformar os mais diversos braços do Estado brasileiro em uma máquina de arrecadação de propinas’. Michel Temer e seu aliado e ex-ministro Moreira Franco (Minas e Energia) foram presos nesta quinta-feira, 21.
“Michel Temer é o líder de uma organização criminosa, que ocupou durante ao menos quase duas décadas muitos dos cargos mais importantes da República, e se valeu de tal poder político para transformar os mais diversos braços do Estado brasileiro em uma máquina de arrecadação de propinas”, afirmou a Lava Jato.
“O posto de liderança de Michel Temer perante a organização criminosa é facilmente identificável por diversos aspectos. Ele se comportava como quem tem o controle da atividade criminosa dos demais integrantes, de maneira que, mesmo sem ter o conhecimento específico de como cada um deles está praticando seus crimes, mantém o controle geral do que ou não ser feito na atividade criminosa da organização. Assim ele é consultado pelos outros integrantes em momentos críticos e estratégicos dos rumos a serem tomados pela organização, bem como em eventuais embates internos entre integrantes subalternos.”
A Lava Jato afirmou ainda. “Michel Temer, como líder da organização criminosa, possuía ascendência sobre todos os núcleos, especialmente o político e o financeiro, se relacionando ainda com a cúpula do núcleo empresarial, isto é, com os donos de grandes empresas dispostos a pagarem propina. Reforça essa liderança de Michel Temer perante a organização criminosa os cargos de chefia tanto sem seu partido, como cargos políticos.”
O ex-presidente recebeu voz de prisão da Polícia Federal quando saía de sua residência logo no início da manhã, na rua Bennet, no Jardim Universidade, zona oeste da capital paulista. A PF fez buscas na casa de Temer e também em seu escritório.
A Polícia Federal cumpre um total de oito mandados de prisão preventiva e dois de custódia temporária, 26 de busca e apreensão nos Estados do Rio de Janeiro, de São Paulo e do Paraná e no Distrito Federal.
O juiz Marcelo Bretas, da 7.ª Vara Criminal Federal do Rio, mandou custodiar por tempo indeterminado o coronel reformado da Polícia Miliar João Baptista Lima Filho – o coronel Lima -, de sua mulher de Maria Rita Fratezi, dos empresários Carlos Alberto Costa, Carlos Alberto Costa Filho, Vanderlei de Natale e Carlos Alberto Montenegro Gallo. O juiz ainda decretou as custódias temporárias de Rodrigo Castro Alves Neves e Carlos Jorge Zimmermann.
O magistrado ordenou busca e apreensão nos endereços desses investigados, assim como da filha do ex-presidente Maristela Temer, do almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, de Ana Cristina da Silva Toniolo e de Nara de Deus Vieira. Também foram realizadas buscas nas empresas vinculadas aos investigados.
A ação que prendeu Temer e seus aliados é decorrente da Operação Radioatividade, que mirou um esquema de cartel, corrupção ativa e passiva, lavagem de capitais e fraudes à licitação que atuou na construção da usina nuclear de Angra 3.
A nova investigação apura pagamentos ilícitos feitos por determinação do empreiteiro José Antunes Sobrinho, ligado à Engevix, para ‘o grupo criminoso liderado por Michel Temer, bem como de possíveis desvios de recursos da Eletronuclear para empresas indicadas pelo referido grupo’.
A Lava Jato identificou um ‘sofisticado esquema criminoso para pagamento de propina na contratação das empresas Argeplan, AF Consult Ltd e Engevix para a execução do contrato de projeto de engenharia eletromecânico 01, da usina nuclear de Angra 3’. O Ministério Público Federal afirmou que a Argeplan, de coronel Lima, ‘participou do consórcio da AF Consult LTD, vencedor da licitação para a obra da Usina Nuclear de Angra 3, apenas para repassar valores a Michel Temer’.
Segundo a Procuradoria, a AF Consult do Brasil e a Argeplan não tinham pessoal e expertise suficientes para a realização dos serviços, e, por isso, houve a subcontratação da Engevix. No curso do contrato, conforme a investigação, coronel Lima solicitou ao sócio da empresa Engevix o pagamento de propina, em benefício de Michel Temer.
A Lava Jato destaca que a propina foi paga no final de 2014 com transferências totalizando R$ 1,91 milhão da empresa da Alumi Publicidades para a empresa PDA Projeto e Direção Arquitetônica, controlada pelo coronel Lima.
Para justificar as transferências de valores foram simulados contratos de prestação de serviços da empresa PDA para a empresa Alumi.
O empresário que pagou a propina afirma ter prestado contas de tal pagamento para o coronel Lima e para Moreira Franco.
As investigações apontaram que os pagamentos feitos à empresa AF Consult do Brasil ensejaram o desvio de R$ 10, 859 milhões, ‘tendo em vista que a referida empresa não possuía capacidade técnica, nem pessoal para a prestação dos serviços para os quais foi contratada’.
De acordo com a Lava Jato, o esquema ‘praticou diversos crimes envolvendo variados órgãos públicos e empresas estatais, tendo sido prometido, pago ou desviado para o grupo mais de R$ 1,8 bilhão.
A investigação aponta que diversas pessoas físicas e jurídicas usadas de maneira interposta na rede de lavagem de ativos de Michel Temer continuam recebendo e movimentando valores ilícitos, além de permanecerem ocultando valores, inclusive no exterior.
Os procuradores afirmam que ‘quase todos os atos comprados por meio de propina continuam em vigência e muitos dos valores prometidos como propina seguem pendentes de pagamento ao longo dos próximos anos’.
Segundo a força-tarefa, as apurações também indicaram uma espécie de braço da organização, especializado em atos de contrainteligência, a fim de dificultar as investigações, tais como o monitoramento das investigações e dos investigadores, a combinação de versões entre os investigados e, inclusive, seus subordinados, e a produção de documentos forjados para despistar o estado atual das investigações.
O Ministério Público Federal requereu a prisão preventiva de alguns dos investigados, pois, todos esses fatos somados apontam para a existência de uma organização criminosa em plena operação, envolvida em atos concretos de clara gravidade.
“A decretação da prisão preventiva de Michel Temer surpreendeu o mundo jurídico e a sociedade brasileira com certeza tendo em vista a sua flagrante desnecessidade. Não se tem conhecimento de nenhum fato que autorizasse essa medida de força uma vez que Michel Temer, desde que saiu da Presidência está, como sempre esteve, pronto a responder a qualquer intimação da Justiça ou da polícia, não tendo sido, no entanto, procurado por nenhuma autoridade policial ou judiciária.”
O presidente estava levando uma vida de inteiro conhecimento público, diariamente em seu escritório e em sua casa à noite. Não estava programando nenhuma viagem, estando, portanto, isento de qualquer medida que cerceasse a sua liberdade. Por tais razões sua prisão nos parece absolutamente desnecessária.”
O advogado Eduardo Carnelós, que defende Michel Temer, afirmou que a prisão do ex-presidente ‘é uma barbaridade’.
NOTA DO MDB
O MDB lamenta a postura açodada da Justiça à revelia do andamento de um inquérito em que foi demonstrado que não há irregularidade por parte do ex-presidente da República, Michel Temer e do ex-ministro Moreira Franco. O MDB espera que a Justiça restabeleça as liberdades individuais, a presunção de inocência, o direito ao contraditório e o direito de defesa.
Do Estadão