Para Ilona Szabó, decisão de Moro tira espaço da pluralidade e do debate de ideias
A especialista em segurança pública Ilona Szabó de Carvalho lamentou nesta quinta-feira (28) o recuo do ministro Sergio Moro em relação à sua nomeação como membro suplente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.
“O sentimento é de que quem ganha é a polarização, perde a pluralidade e o debate de ideias, tão fundamentais numa democracia. Lamento profundamente que grupos minoritários mais extremados consigam impedir que que pessoas comprometidas com o bem público, mesmo com divergências, possam sentar na mesa para a construção de um bem maior”, disse ela à Folha.
O recuo de Moro sobre Szabó, que é colunista da Folha, aconteceu após pressão nas redes sociais de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PSL). Em nota, o ministério admite que o recuo é por causa das críticas recebidas. “Diante da repercussão negativa em alguns segmentos, optou-se por revogar a nomeação, o que foi previamente comunicado à nomeada e a quem o Ministério respeitosamente apresenta escusas”, diz a nota.
O próprio presidente Bolsonaro pressionou Moro pelo recuo após a repercussão negativa entre militantes pró-governo. Szabó foi comunicada à tarde pelo ministro Moro.
Especialista em segurança pública, ela é contrária ao afrouxamento das regras de acesso a armas, política do governo Bolsonaro. Também já criticou em artigo o pacote anticrime de Moro ao considerar preocupantes, entre outras coisas, as medidas que tendem a ampliar o direito à legítima defesa.
É cofundadora e diretora-executiva do Instituto Igarapé, que produz pesquisas sobre segurança, justiça e desenvolvimento. Ela havia sido recebida na quarta-feira (27) pelo próprio Moro.
A especialista afirmou que, além de fazer parte de vários conselhos e instâncias de diferentes origens e orientações políticas, também teve abertura para debater com todos os ministros da Justiça nos últimos 15 anos. “Precisamos de um presidente que pense na República, que governe para um país diverso, plural, e que saiba que faz parte do jogo democrático a pluralidade de vozes.”
Mesmo ao recuar da indicação, a pasta defendeu a nomeação de Szabó para o órgão. “A escolha foi motivada pelos relevantes conhecimentos da nomeada na área de segurança pública e igualmente pela notoriedade e qualidade dos serviços prestados pelo Instituto Igarapé”, cita a nota.
Após a decisão, o diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, pediu exoneração da vaga que ocupa no Conselho “em caráter irrevogável e em solidariedade” a Ilona, que, segundo ele, “foi colocada em uma situação constrangedora”.
O Instituto Sou da Paz divulgou nota em solidariedade à pesquisadora. “Politizar a composição destes fóruns e, pior, expor quem voluntaria-se a ajudar, como foi o caso, demonstram duplamente a fragilidade da democracia brasileira e enfraquecem a capacidade de superação da grave situação de segurança pública”, diz o instituto.
A escolha havia sido um dos assuntos mais comentados no Twitter nesta quarta, sobretudo pela ação de militantes pró-Bolsonaro. Críticos da nomeação promoveram no Twitter a hashtag #Ilonanão.
Nas publicações, militantes têm atacado Moro ao ressaltar que Szabó tem posições divergente do governo com relação a temas como armamento e política de drogas. Também criticam o fato de que ela se posicionou contra a candidatura de Bolsonaro ainda durante as eleições.
Na quarta, enquanto os ataques ocorriam nas redes sociais, Szabó encontrou-se com Moro para reunião baseada na pauta do conselho. Como a campanha contrária a seu nome continuou forte nesta quinta, ela própria entrou em contato com a pasta. Em seguida, recebeu uma ligação do ministro.
“Ele disse da pressão nas redes do presidente, com essa base mais extrema de eleitores, e que não conseguiria manter”, diz. “O ministro foi muito correto comigo, muito transparente”, completa ela, que se colocou à disposição para continuar discutindo a pauta de segurança.
Szabó ressaltou ainda que, por ser mulher, os ataques tomaram outro tipo de proporção. “Por ser mulher, é outra proporção de ataques. Não é mais concordar, foi algo de bastante má-fé”, diz. “Eu era a única mulher nesse governo, onde a representação feminina é muito pequena.
O conselho é ligado ao Depen (Departamento Penitenciário Nacional). Entre suas atribuições estão avaliações do sistema penitenciário, proposição de diretrizes da política criminal e inspeções e fiscalizações de estabelecimentos penais.
A designação havia sido publicada no Diário Oficial da União de quarta-feira (27). Outros oito membros haviam sido nomeados e cinco, reconduzidos.
Em nota encaminhada na quarta, o Instituto Igarapé havia elogiado “o gesto louvável” do ministro ao pensar em vozes plurais para o Conselho. A participação no grupo é voluntária e o mandato é de dois anos. O Conselho é um órgão consultivo, sem funções executivas no governo.
Da FSP