Pesquisas mostram que autores de ataques em massa estudam com frequência os métodos de agressores
O ataque a muçulmanos durante as orações de sexta-feira na Nova Zelândia é o último exemplo de um fenômeno assustador: violência em massa, seguida de revelações de que os terroristas estudaram e se inspiraram claramente em massacres prévios.
É uma sequência recorrente que se repete nos EUA. O resultado é uma linha de horror que liga um subúrbio do sul da Flórida ao Oregon rural, os bancos de uma igreja do Texas à pista de dança de uma boate de Orlando.
Na Nova Zelândia, a conexão aparece em um manifesto citando os supremacistas brancos que em 2015 mataram nove paroquianos negros numa igreja de Charleston, Carolina do Sul, bem como o assassino norueguês que em 2011 matou 77 pessoas em um ataque a bomba e a tiros num acampamento de verão para adolescentes.
Há uma espécie de “retroalimentação” entre os matadores em massa, disse Peter Blair, professor de Justiça Criminal e coautor de um estudo de 2013 do FBI sobre esse tipo de crime. “Eles pesquisam ataques anteriores tentando aprender com os autores, inspirando-se neles, citando o que eles disseram.”
Pesquisas mostram que os autores de ataques em massa estudam com frequência os métodos de antigos agressores – em alguns casos, imitam-nos –, de modo similar àquele com que terroristas aperfeiçoam suas táticas. A onda de ataques com caminhões desencadeada pelo Estado Islâmico (EI) é um claro exemplo.
Especialistas dizem que agressores em massa tendem a ter similaridades, incluindo um senso pessoal de vitimização. Quando Paul Mullen, pesquisador australiano, estudou o perfil de cinco atiradores a partir de 2004, descobriu que eles também anseiam por tornar-se famosos, visando “bater o recorde”.
O massacre de Columbine é frequentemente citado como referência pelos agressores, não apenas nos EUA. Num artigo de 2009 sobre o caso uma década depois, Ralph Larkin, do John Jay College of Criminal Justice, constatou que em seis massacres do gênero fora dos EUA, Columbine foi imitado ou citado.
O manifesto da Nova Zelândia faz referência a “invasores que querem tomar nossa terra”. O homem acusado de matar 11 pessoas numa sinagoga de Pittsburgh no ano passado postou um comentário raivoso sobre um grupo que ajudava refugiados, dizendo que “eles gostam de trazer para cá invasores”.
Examinar ou tomar como referência antigos agressores pode mostrar o que influencia o pensamento do assassino. Um manifesto mencionando Charleston e o matador norueguês demonstra isso no caso da Nova Zelândia, disse Adam Lankford, professor de criminologia da Universidade do Alabama e especialista em massacres. “De onde esse cara tirou a ideia de matar estrangeiros num ataque em massa num local religioso? Ele não inventou isso. Está basicamente contando onde se inspirou.”
Especialistas dizem que a internet ajuda a acelerar o processo pelo qual futuros agressores encontram inspiração. “A internet é um divisor de águas no terrorismo”, disse Jeffrey Simon, consultor de segurança e conferencista visitante na Universidade da Califórnia. “Não apenas para lobos solitários ou pequenas células terroristas, mas também para grupos. Ela se tornou um tipo de entrada que permite a um perpetrador citar outros e dar justificativas.”
Mary McCord, ex-assistente de segurança nacional do Departamento de Justiça americano, disse que, dado “o sentimento anti-imigrantes e outros ‘antis’ no mundo”, não surpreende que pessoas inclinadas ao extremismo e à violência estudem prévios agressores como modelo. Para ela, a habilidade deles em aprender com outros evoca algo que aconteceu com o EI, que conseguia transmitir mensagens online mais rápido que A l-Qaeda.
“Você vê o mesmo quando se trata da violência de supremacistas brancos e de terrorismo doméstico”, disse ela. Antes era preciso reunir fisicamente as pessoas, mas “agora você consegue fazer isso rapidamente pela internet e formar grupos com ideias semelhantes, mostrando-os mais palatáveis e organizados do que realmente são graças à amplificação da mídia social.”
Do Estadão