Ciclone arrasa quarta maior cidade de Moçambique e número de mortos pode chegar a mil

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A distribuição de alimentos a milhares de sobreviventes do ciclone Idai no sul da África começou de forma caótica, enquanto as equipes de resgate socorriam os sobreviventes presos em telhados ou campos alagados. O ciclone, que devastou na semana passada Moçambique e depois o Zimbábue, deixou 557 mortos até agora nos dois países e no Malauí, provocou inundações, destruiu estradas e cortou comunicações em diversas comunidades, afetando pelo menos 1,7 milhão de pessoas.

De acordo com a Cruz Vermelha, a cidade portuária de Beira, quarta maior do Moçambique, sofreu danos maciços com o rompimento de uma barragem, piorando ainda mais a situação. Lá, moradores sofrem com a escassez de alimentos, água e outros itens essenciais. O Programa Mundial de Alimentos (PMA), que já ajudou até agora cerca de 600 mil pessoas na região, começou a distribuir alimentos, principalmente biscoitos enriquecidos com vitaminas.

Karin Manente, representante do PMA no país, conta que um dos maiores desafios é o acesso a áreas isoladas em Beira, onde só é possível chegar por barco, helicóptero ou avião.

— As estradas estão todas danificadas. Nunca vi tanta destruição nos oito anos que trabalhei aqui. Acabamos de enviar alimentos por barco e amanhã (sábado) teremos que mandar por avião — contou ao GLOBO por telefone, de Moçambique. — Para essas regiões, levamos biscoitos enriquecidos, mais fáceis de serem consumidos, já que não há como cozinhar alimentos. Já nos abrigos e centros de acomodação, distribuímos papas enriquecidas de soja.

Vilas inteiras desapareceram em Moçambique. Em Dondo, no centro do país, centenas de pessoas correram na quinta-feira para receber uma ração em uma escola transformada em abrigo. Segundo Karim, as condições são precárias. Na escola há cerca de 900 famílias, que escaparam das suas casas com muito pouco, “praticamente só com a roupa que estava no corpo”.

— Eu tenho quatro filhos e eles só me dão pão? Preciso de um saco de comida — reclamou um homem.

— Eles não distribuem para todos, apenas para aqueles que estão dentro. Aqueles que estão do lado de fora não recebem nada — lamentou Marta Antonio, que carregava seu filho pequeno.

Cerca de 15 mil pessoas ainda estão desaparecidas em Moçambique, disse o ministro da Terra e do Meio Ambiente, Celso Correia, nesta sexta-feira. Há temor de que o número de mortos ainda possa crescer significativamente. Os socorristas começarão a usar drones para inspecionar as áreas inundadas.

— Vamos ter uma ideia melhor das áreas afetadas— explicou Correia.

Connor Hartnady, líder de uma força-tarefa da Resgate África do Sul, disse que um grupo de 60 pessoas foi descoberto preso por águas das enchentes em uma área ao norte de Beira durante um voo de reconhecimento. Equipes de resgate e o governo estão decidindo a melhor maneira de ajudá-las, pelo ar ou levando suprimentos.

No Brasil, a ONG ActionAid lançou uma campanha com pedidos de doações para prover sumprimentos básicos, como água e comida, às populações afetadas nos três países.

— O distrito de Busi está quase totalmente submerso. Em desespero, as famílias estão atravessando a água para tentar chegar a um lugar seguro — relatou a gestora de Projetos da ActionAid em Moçambique, Marcia Cossa.

Corpos arrastados pela fronteira
Na cidade de Beira, de meio milhão de habitantes, o hospital principal, cujo telhado foi parcialmente danificado, só funciona a 40% de sua capacidade. Mas nas ruas, a normalidade retornava progressivamente, e na sexta-feira filas se formavam diante dos bancos que reabriam as portas. Os veículos já podiam circular por algumas ruas e a rede telefônica, interrompida por vários dias, voltou a funcionar, embora intermitentemente.

— A eletricidade ainda não voltou, mas a telefonia sim, bem aos poucos. Por enquanto apenas uma rede está funcionando totalmente — disse Karin. — É um país que infelizmente é muito afetado pelas mudanças climáticas, com secas, cheias e ciclones. No dia a dia, o plano de contingência do governo funciona bem, mas esse ciclone impactou muito, porque se trata de uma emergência de grande porte, sem dúvida a mais grave que já vivenciei.

Quanto à saúde, a preocupação cresce. Houve casos de diarreia, de acordo com o prefeito de Beira, enquanto voluntários e socorristas alertaram para o risco de cólera ou febre tifoide.

No Zimbábue, o distrito de Chimanimani foi isolado do resto do país pelas chuvas torrenciais e ventos de até 170 km/h que varreram estradas, pontes e casas, derrubando linhas de abastecimento de energia e comunicação. Segundo o ministro da Defesa do país, mais de 120 corpos foram arrastados até Moçambique e lá enterrados por moradores locais.

— As pessoas perderam o gado, os frangos e as cabras de que dependem para viver. É extrema a necessidade de comida, água, abrigo e remédios — contou Toendepi Kamusewu, gstor de projetos da ActionAid que está liderando as ações de resposta à emergência no Zimbábue. — Minha maior preocupação é como conseguir ajuda rapidamente para as pessoas mais afetadas em Chimanimani. Até quarta-feira, nenhum alimento ou kits de água e saneamento haviam chegado às pessoas que estão isoladas e desabrigadas em Manicaland.

De O Globo