Nabil Bonduki: urbanização de São Paulo requer mudanças estruturais

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As chocantes imagens de segunda-feira (11) expuseram o desastre da urbanização de São Paulo e abrem uma oportunidade para debater a necessidade de mudança do modelo de desenvolvimento urbano insustentável do século 20.

A Folha mostrou que nos últimos três anos das gestões municipal e estadual foram executados 41% do orçamento previsto para o combate às enchentes. Isso é grave, mas é apenas uma pequena parte do problema.

Construir mais piscinões é necessário frente aos equívocos do passado, mas, se não for alterada a lógica da urbanização, as enchentes se repetirão, pois o problema é estrutural e exige mudanças mais profundas.

São Paulo cresceu sem respeitar o meio físico. O solo foi excessivamente impermeabilizado e áreas verdes, destruídas. A arborização urbana foi negligenciada em meio a ruas estreitas e repletas de fiação aérea.

As faixas de 30 metros ao longo de córregos e rios, que deveriam ser preservadas, foram ocupadas por avenidas, na lógica da prioridade para o automóvel, por loteamentos e condomínios, na lógica imobiliária, e por favelas, inevitáveis frente ao pequeno número de moradias produzidas para os mais pobres.

Assentamentos precários junto aos córregos ou em encostas íngremes tornam-se áreas de risco, onde 6 dos 13 mortos foram soterrados em desabamentos. Os outros se afogaram, tragados pela correnteza em áreas que nunca deveriam ter sido urbanizados.

A drenagem é insuficiente para absorver os altos índices pluviométricos, agravada pela impermeabilização do solo e falta de arborização, que ampliam e aceleram a chegada da água nos fundos de vale.

Causa espanto a afirmação de que choveu mais do que se esperava. É normal, periodicamente, ocorrerem picos de alta precipitação. E as águas de março são tão comuns que foram eternizadas pela voz de Elis Regina. As mudanças climáticas e a expansão urbana da macrometrópole, que amplia a ilha de calor da região metropolitana, tornam as tempestades mais fortes.

Enfrentar o problema de modo sustentável e permanente requer mudanças estruturais no modelo de desenvolvimento urbano, implementando medidas previstas no Plano Diretor de São Paulo, a saber:

1. ampliar a permeabilidade do solo e do subsolo, implementando a cota ambiental, implantando parques e ampliando a arborização urbana, com adequado manejo;

2. implantar tanques de retenção nos lotes, para retardar a chegada das água ao sistema de drenagem, solução mais sustentável do que os custosos piscinões;

3. conter a expansão horizontal da área urbanizada, fortalecendo a zona rural, já adotada em São Paulo e que precisa ser estendida para toda a região metropolitana;

4. produzir moradias em escala, para remanejar os moradores em áreas de risco e em fundo de vale, retomando os investimentos subsidiados do Estado e da União para atender a baixa renda;

5. reduzir a geração de resíduos sólidos e melhorar a manutenção e limpeza das ruas, para evitar o acúmulo de lixo que reduz a vazão do sistema de drenagem e gera assoreamento de córregos;

6. criar um sistema de alerta em áreas de risco para situações de emergência.

A tragédia deve servir de alerta para que a opinião pública se conscientize de que o planejamento urbano é indispensável e que apenas medidas estruturais podem garantir resultados permanentes e sustentáveis para a segurança dos cidadãos.

Da FSP