Consultor de Witzel é reconhecido por vítimas e delator por praticar extorsão

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O policial civil Flávio Pacca, apresentado pelo governador Wilson Witzel como seu “assessor especialista na área de tiro”, foi delatado ao Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público, por um homem que se passava por policial civil somente para praticar extorsões. Após ser preso, em 2017, o falso agente passou a colaborar com as investigações. Pacca e outros três agentes também foram reconhecidos por dois homens — um dono de uma oficina mecânica que tinha uma gato de água e um proprietário de um automóvel irregular — como os policiais autores da extorsão de que foram vítimas. Os dois acabaram pagando R$ 5 mil para não serem presos.

Pacca foi preso nesta quinta-feira, em casa, na Glória, bairro da Zona Sul do Rio, na terceira fase da operação Quarto Elemento. Além do amigo de Witzel, também foram presos os agentes Helio Ferreira Machado e Tiago Pereira — os três eram lotados na 52ª DP (Nova Iguaçu), à época. Ricardo Canavarro, também denunciado pelo Ministério Público, já estava preso.

O colaborador, em depoimento ao MP estadual, contou que, à época do crime, atuava como um falso policial, usando viaturas oficiais da Polícia Civil e frequentando delegacias. No entanto, sua única atribuição era encontrar possíveis vítimas de extorsões e comunicar a policiais civis. Com a informação em mãos, os agentes e o colaborador iam ao local “dar o bote” — capturar as vítimas para, em seguida, soltá-las em troca de dinheiro.

No dia 5 de julho de 2017, o colaborador repassou a seu comparsa Ricardo Canavarro a localização de uma oficina mecânica em Nova Iguaçu que, segundo ele, tinha uma série de irregularidades. Canavarro, na ocasião, estava de licença médica e não era sequer lotado na 52ª DP. No entanto, ainda segundo o depoimento do colaborador, Canavarro foi até a delegacia arregimentar colegas para o “bote”. Assim, Pacca, Hélio e Tiago se juntaram a Canavarro e foram até a oficina. O delator não foi com o grupo ao estabelecimento.

No local, os policiais encontraram um gato de luz e um carro roubado sendo consertado. O dono do estabelecimento foi detido na hora e obrigado, segundo os relatos do próprio mecânico e do colaborador, a entrar em contato com o dono do carro, que foi ao local e também foi detido. Os agentes voltaram de viatura à sede da delegacia, já os donos do carro e da oficina foram ao local em veículo particular.

Na sede da unidade, foram levados até uma sala, onde permaneceram por uma hora. As vítimas reconheceram Pacca e Helio como os homens que recolheram seus celulares. Segundo investigadores, o policial, que concorreu a deputado federal pelo mesmo partido de Witzel, foi reconhecido “sem muita dificuldade”, devido a sua barba comprida. Para negociar com as vítimas, o colaborador foi chamado à delegacia. O homem comprovou aos promotores do Gaeco que estava lá, pois forneceu ao MP dados de sua conta do Google que informam seu geoposicionamento no dia do crime.

Na sala, segundo o próprio colaborador, a negociação começou com R$ 50 mil, pedidos pelos policiais. As vítimas afirmaram que não tinham esse dinheiro. O colaborador então afirmou ter dito aos dois que aceitassem a proposta, “senão a delegacia não vai deixar vocês em paz”. O acordo foi fechado em R$ 10 mil, sendo que a primeira parte seria paga no mesmo dia. Os celulares foram devolvidos e as vítimas, liberadas. Nenhum registro de ocorrência sobre o caso, de receptação ou furto de energia elétrica, foi feito pelos policiais. Mesmo constando como produto de roubo, o carro de uma das vítimas não foi apreendido.

Segundo o colaborador — que está no Programa de Proteção a Testemunhas —, só metade do valor acordado foi de fato pago. cada um dos envolvidos teria ficado com R$ 1 mil.

De amigo a assessor

Após a prisão de Pacca, Wilson Witzel negou que o amigo fosse seu “consultor na área de segurança”.

— Ele não é meu consultor de segurança. Ele foi candidato a deputado federal pelo PSC, para se candidatar apresentou certidões de antecedentes criminais e disputou a eleição — disse o governador, em entrevista coletiva. Witzel também disse que estudou junto com Pacca na faculdade, mas que tem relacionamento normal com vários outros colegas e alunos.

Entretanto, a proximidade entre Pacca e Witzel é tanta que o policial é figura fácil em vários momentos importantes do governo até aqui. Durante a campanha, os dois fizeram várias carreatas juntos. Pacca, mesmo não tendo sido eleito, estava presente na primeira reunião de trabalho da equipe de transição de Witzel com o Gabinete de Intervenção Federal, em novembro do ano passado. Uma semana depois, quando a nova estrutura da Polícia Civil foi apresentada a autoridades, lá estava novamente Pacca com o governador. O policial também estava presente na posse de Witzel, no Palácio Guanabara, onde ficou na área reservada aos convidados.

Em novembro, ao portal G1, Witzel chamou Pacca de “assessor especialista na área de tiro” e disse que o disse que ele estava ajudando a montar um cronograma de treinamento para snipers.

“Eu estou aqui com o especialista, o Flávio Pacca, é meu assessor especialista nessa área de tiro e ele está me ajudando a montar esse cronograma, esse programa de formação dos nossos policiais de operações especiais. Cada batalhão vai ter uma unidade de operações especiais”, disse Witzel, na ocasião.

De O Globo