Guedes usa a reforma da Previdência para sucatear ainda mais a Justiça do Trabalho

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Leia o texto de João Chaves, advogado e colaborador do Blog da Cidadania

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Vigente desde 11 de novembro de 2017, a reforma trabalhista aprovada no governo Michel Temer modificou cerca de 200 artigos na Consolidação das Leis do Trabalho, mas atingiu o seu objetivo principal: intimidou trabalhadores e trabalhadoras que desejariam ingressar com ações contra violações de seus direitos. Tribunais trabalhistas apontam queda de cerca de 40% no volume de ações trabalhistas propostas (https://www.conjur.com.br/2018-mai-11/reforma-trabalhista-derruba-demanda-trt-40-presidente).

A isso, se devem diversos fatores. O governo Temer aprovou, a toque de caixa, significativa alteração em uma legislação complexa como a trabalhista, com pouco espaço para debates e discussões sobre os seus pontos positivos e negativos. Interessados diretos na aprovação, os grandes oligopólios de mídia foram cúmplices na sonegação de informações, reduzindo as opiniões contrárias a interesses corporativos de sindicatos de empregados insatisfeitos com o fim da contribuição sindical compulsória.

Ocorre que o novo artigo 611-A da CLT reforça a importância entre as negociações sindicais, ao passo que a extinção do chamado imposto sindical é danosa principalmente aos sindicatos de empregados, enquanto grande parte dos sindicatos de empregadores são beneficiados por verbas provenientes do Sistema S. Portanto, sindicatos de empregados são diretamente prejudicados por essas medidas, enfraquecidos nas negociações com empregadores que seguirão recebendo valores provenientes do Sistema S.

A fim de cumprir o intuito de intimidar o trabalhador na busca por seus direitos, foram amplamente noticiadas pela mídia duas sentenças flagrantemente ilegais tomadas nos primeiros dias de vigência da reforma.

Em uma delas, a reclamante havia sido condenada a pagar custas e honorários ao banco Itaú (https://exame.abril.com.br/negocios/ex-funcionaria-e-condenada-a-pagar-r-675-mil-ao-itau/), em decisão posteriormente reforma pela Justiça (https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2018/07/10/justica-anula-decisao-bancaria-condenada-a-pagar-itau.htm). Em outra, ainda no primeiro dia de vigência da reforma, com o evidente intuito de ganhar as manchetes, a decisão condenou o empregado ao pagamento de quase um ano de salário, a título de custas processuais (https://www.conjur.com.br/2017-nov-13/baseado-reforma-trabalhista-juiz-condena-trabalhador-ma-fe), em sentença também posteriormente reformada pelo Tribunal local (https://www.conjur.com.br/2018-jun-05/primeiro-trabalhador-condenado-reforma-fica-isento-honorarios).

Em ambos os casos, as decisões arbitrárias de primeira instância foram divulgadas com grande alarde pela mídia, ao passo que as decisões dos tribunais foram noticiadas com maior comedimento. Tais condutas geraram efeitos sobre a população, que se vê receosa e insegura quanto à Justiça do Trabalho, diante do consórcio formado entre a imprensa e o governo Temer.

No mercado de trabalho, as mudanças só não foram mais significativas porque ainda seguem pendentes de análise no Supremo Tribunal Federal os dispositivos mais polêmicos da reforma. De composição majoritariamente liberal, a Corte deve confirmar a constitucionalidade das principais alterações e reforçar o já identificado agravamento das nossas mazelas sociais (https://www.valor.com.br/brasil/5617411/reforma-trabalhista-aumentou-desigualdade-dizem-pesquisadores).

Encorajados pela pouca resistência enfrentada na sociedade civil para aprovação da nova lei trabalhista, Bolsonaro e Paulo Guedes agora se sentem à vontade para avançar sobre os direitos trabalhistas remanescentes. Há previsão para novas alterações já na reforma da previdência, como a exoneração do pagamento do FGTS para aposentados (https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2019/02/texto-acaba-com-depositos-do-fgts-e-multa-para-aposentado-que-trabalha.shtml) e a precarização do trabalho para os jovens recém-ingressos no mercado de trabalho (https://www.gazetadopovo.com.br/politica/republica/nova-previdencia-tera-regime-trabalhista-opcional-para-jovens-0ict995nxbrkl0s7d64ftzcd7/), inclusive com possibilidade de tornar facultativa a contribuição previdenciária, o que pode gerar novos problemas fiscais no futuro.

Essas previsões estão de acordo com as posições do ministro Paulo Guedes, que nunca escondeu o seu desapreço pela CLT e pela Justiça do Trabalho. Portanto, ainda que a reforma da previdência não seja aprovada nestes termos, é possível esperar investidas futuras contra a lei trabalhista.